segunda-feira, 31 de janeiro de 2011


Ciclo Seco [ breve introdução ]
Todo mundo conhece ciclo seco, a maioria até já passou por ele. Alguns mesmo vivem desde sempre dentro dele, achando que isso é vida e eternizando o que, por ser ciclo, deveria também ser transitório. É preciso acreditar que passa, embora quando dentro dele seja difícil e quase impossível acreditar não só nisso, mas em qualquer outra coisa. Não que ciclo seco não tenha fé, o que acontece é que não podendo ver o que não é visível, fica limitado ao real.
Antes de ir em frente, é importante dizer que ciclo seco nada tem a ver com as estações do ano. É coisa de dentro do humano, não de fora, e justamente por isso não tem nenhum método: vem quando não é esperado e vai quando não se suspeita. Ciclo seco não desaba de repente sobre alguém; chega aos poucos, insidioso, lento. Quando se percebe que se instalou, geralmente é tarde demais. Já está ali. É preciso atravessá-lo como a um deserto, quando se está no meio e a água acabou. Por ser limitado ao real, o ciclo seco jamais considera a possibilidade de um oásis ou de uma caravana passando. Secamente, apenas vai em frente.
Porque o real do ciclo seco são ações, não pensamentos nem imaginações. Tanto que, visto de fora, não é visível nem identificável. Não se confunde com “depressão”, quando você deixa de fazer o que devia, ou com “euforia”, quando você faz em excesso o que não devia. Em ciclo seco faz-se exatamente o que se deve ou não, desde escovar os dentes de manhã ou beber um uísque à tardinha, mas sem prazer. Nem desprazer: em ciclo seco apenas se age, sem adjetivos. A propósito, ciclo seco não admite adjetivos — seco é apenas a maneira inexata de chamá-lo para que, dando-lhe um nome, didaticamente se possa falar nele.
E deve-se falar dele? Quero supor, entusiástico, que sim. Mas não tenho certeza se dar nome aos bois terá alguma serventia para o dono dos bois ou sequer para os próprios bois — e essa é uma reflexão típica de ciclo seco. Mas vamos dizer que sim, caso contrário paro de escrever já. E falando-se dele, diga-se ainda que ciclo seco não é bom nem mau, feio ou bonito, inteligente ou burro (…) embora possa dar uma impressão errada a quem o vê de fora, ávido por adjetivar.
Ciclo seco, por exemplo, não se interessa por nada. Pior que não ter o que dizer, ciclo seco não tem o que ouvir, compreende? Fica na mais completa indiferença seja ao terremoto no Japão ou à demissão de Vera Fischer. No plano pessoal, tanto faz ler ou não ler um livro, ir ou não ao cinema — ciclo seco é incapaz de se distrair, de se evadir. Fica voltado para dentro o tempo todo, atento a quê é um mistério, pois que pode um ciclo seco observar de si mesmo além da própria secura, se não há sequer temporais, ventanias, chuvaradas? Nesse sentido, ciclo seco é forte, porque nada vindo de fora o abala, e imutável, porque de dentro nada vem que o modifique.
E nesse sentido também é antinatural, pois tudo se transforma e ele não, simulando o eterno em sua digamos, i-na-ba-la-bi-li-da-de. E sendo assim, com alívio vou quase concluindo, pode se deduzir que… Não, não se pode deduzir nada. Só que passa, por ser ciclo, e por ser da natureza dos ciclos passar. Até lá, recomenda-se fazer modestamente o que se tem a fazer com o máximo de disciplina e ordem, sem querer novidades. Chatíssimo bem sei. Mas ciclo seco é assim mesmo.
Todo mundo tem os seus, é preciso paciência. E contemplá-lo distante como se se estivesse fora dele, e fazer de conta que não está ali para que, despeitado, vá-se logo embora e nos deixe em paz? Eu, francamente não sei. Ainda mais francamente, nem sequer sinto muito.
Caio Fernando Abreu in Pequenas Epifanias

sábado, 29 de janeiro de 2011


Uma conhecida história conta que o rabino viu um sujeito correndo desenfreado pelo mercado. Esbaforido, segurava com uma mão a mala e com a outra o chapéu para que não voasse. O rabino chamou o homem que, entre golfadas de ar, o cumprimentou. “Para onde você corre com tanta pressa?”, perguntou o rabino. “Como assim?”, disse o homem, não escondendo sua irritação por ter que parar. “Estou tentando ganhar a vida e corro atrás de meu sustento! Há oportunidades lá na frente que, se eu não correr, serão perdidas!” “E como você sabe que as oportunidades estão à sua frente?”, disse o rabino. “Quem sabe elas estão ao seu lado, ou, pior, talvez estejam atrás e você se afastando cada vez mais delas?” O homem ficou sem ação, ao que o rabino concluiu: “Meu amigo, não estou dizendo que não deva ganhar seu sustento, mas me preocupo que, na obsessão com seu ‘ganhar’, esteja comprometendo a ‘vida’.”
Nilton Bonder

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Ganhei este selinho da minha amiga Vivian do blog:
Obrigada Vivian

Agora vamos lá: Passar para 15 pessoas
Ana Mattos
Nelson Aharon
Vivi
Angelina
Sara
Chica
Guaraciaba
AC
Ana Paula
Vanessa Souza Moraes
Si Fernandes
Suzi Montenegro
Patrícia Maez
Glorinha L. de Lion
Esther

Nome: Eliete

Uma música: todas de Chico Buarque e Caetano Veloso

Humor: equilibrada

Uma cor: Azul

Uma estação: Outono

Como prefere viajar: de carro

Um seriado: House

Frase ou palavra dita por você: Que Deus te abençõe

O que achou do selo: Lindo!! Um prazer recebê-lo de Vivian







quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

NAS ÁGUAS DO TEMPO - Mia Couto
Um macaco passeava-se à beira de um rio, quando viu um peixe dentro de água. Como não conhecia aquele animal, pensou que estava a afogar-se. Conseguiu apanhá-lo e ficou muito contente quando o viu aos pulos, preso nos seus dedos, achando que aqueles saltos eram sinais de uma grande alegria por ter sido salvo.
Pouco depois, quando o peixe parou de se mexer e o macaco percebeu que estava morto, comentou - que pena eu não ter chegado mais cedo!"
“A fábula do macaco e do peixe” (Mia Couto)

terça-feira, 25 de janeiro de 2011


(...) Minha infância de menina sozinha deu-me duas coisas que parecem negativas, e foram sempre positivas para mim: silêncio e solidão. Essa foi sempre a área de minha vida. Área mágica, onde os caleidoscópios inventaram fabulosos mundos geométricos, onde os relógios revelaram o segredo do seu mecanismo, e as bonecas o jogo do seu olhar. Mais tarde foi nessa área que os livros se abriram, e deixaram sair suas realidades e seus sonhos, em combinação tão harmoniosa que até hoje não compreendo como se possa estabelecer uma separação entre esses dois tempos de vida, unidos como os fios de um pano."..
Cecília Meireles
.

O dia em que um sorriso parou São Paulo. (The day when a smile stopped S...




Se queres ser leve, se leve sempre prá passear.
Se queres ser livre, se livre de suas mágoas

Se queres ser bom, coloque bombachas na alma.
(Eliete)

domingo, 23 de janeiro de 2011


"Existe um salto entre o imaginário e a realização ?
O imaginário prepara a realização, ou permite economizá-la"?

Colette Chiland em O sexo conduz o mundo

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011


A amizade não é narcísica, ela está centrada no outro, ela se esforça para compreendê-lo e para não lhe pedir oque ele não está em condição de dar.

Saint -Exupéry escreve isso admiravelmente em "Carta a um refém"; Estou tão cansado das polêmicas, das exclusões, dos fanatismos! Posso entrar em tua casa sem me vestir com um uniforme, sem me submeter à recitação de um corão, sem renunciar ao que quer que seja de minha pátria interior.Junto a ti não tenho que me desculpar, não tenho que me defender, não tenho que provar: encontro a paz(...).

fonte: O sexo conduz o mundo de Colette Chiland

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011


À Espera dos Bárbaros de Konstantinos Kaváfis ,
na tradução de José Paulo Paes.

O que esperamos na ágora reunidos?
É que os bárbaros chegam hoje.
Por que tanta apatia no senado?

Os senadores não legislam mais?
É que os bárbaros chegam hoje.

Que leis hão de fazer os senadores?

Os bárbaros que chegam as farão.
Por que o imperador se ergueu tão cedo e de coroa solene
se assentou em seu trono, à porta magna da cidade?
É que os bárbaros chegam hoje.

O nosso imperador conta saudar o chefe deles.
Tem pronto para dar-lheum pergaminho no qual estão escritos muitos nomes e títulos.
Por que hoje os dois cônsules e os pretores usam togas de púrpura, bordadas,e pulseiras com grandes ametistas e anéis com tais brilhantes e esmeraldas?
Por que hoje empunham bastões tão preciososde ouro e prata finamente cravejados?
É que os bárbaros chegam hoje,tais coisas os deslumbram.
Por que não vêm os dignos oradoresderramar o seu verbo como sempre?
É que os bárbaros chegam hojee aborrecem arengas, eloquências.
Por que subitamente esta inquietude?
(Que seriedade nas fisionomias!)
Por que tão rápido as ruas se esvaziam e todos voltam para casa preocupados?
Porque é já noite, os bárbaros não vêm e gente recém-chegada das fronteiras diz que não há mais bárbaros.
Sem bárbaros o que será de nós?
Ah! eles eram uma solução.

O que ganhamos quando fechamos os olhos ?
O que ganhamos quando por covardia não enfrentamos o que precisamos enfrentar?
O que ganhamos quando ficamos à espera de que alguém faça o que cabe a nós fazermos?
O que ganhamos quando não quebramos os ovos?

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Para começar bem o dia


ELOGIO DA LEVEZA

Affonso Romano de Sant'Anna/Tempo de delicadeza

Esse filme sobre a vida de Vinícius de Moraes , que está surpreendendo pelo sucesso de público , me fez pensar sobre a necessidade que temos de recuperar a leveza . Houve um tempo , não faz muito , há uns 30 ou 40 anos , em que éramos mais leves . Depois vieram os “ anos de chumbo ” e desde então estamos mais para a quaresma do que para o carnaval .
Vinícius, por exemplo , era leve , tão leve , que chegava a ser leviano na gravidade de suas paixões . Tom Jobim era leve . Vinícius e Tom eram leves e engraçados . Ser leve e ser engraçado era uma característica daquela geração .
Otto Lara Rezende era leve . Era um campeão do peso pluma . Não pesava a ninguém . E vou lhes dando outros exemplos . Antônio Maria, apesar de bem gordo , era leve , basta ler também suas crônicas , como essas no volume “Seja feliz e faça os outros felizes ”(Ed. Record). Quer ver outro dessa turma levinho e engraçado- Stanislaw Ponte Preta , vulgo Sérgio Porto .

Posso alongar a lista : Ronaldo Boscoli e Miele, mais uma dupla leve . As estorinhas deles convencem a gente que a vida é uma gafe permanente e divertida. Fernando Sabino também ia por aí . Se a gente o encontrava tinha sempre noção de que ia achar graça em alguma coisa . O próprio Paulo Mendes Campos , mais retraído , era um contador de “ causos ” dele e dos amigos . Você podia estar com o Hélio Pellegrino, que sendo analista , hora nenhuma nos passava a idéia de que estava analisando nossas neuroses , não estava aí para julgar ninguém .
Com isto , as crônicas refletiam a leveza da vida . Não é que não houvesse drama e tragédia , mas as pessoas não eram baixo astral nem a crônica é como nos dias atuais uma coisa chata e pesada .
Nesses dias em que o filme sobre o Vinícius já estava passando eu tinha que fazer uma conferência sobre ele lá em Porto Alegre e acabei encontrando dentro de suas poesias completas um recorte do qual havia me esquecido totalmente. Era um texto recuperado por Genetton Moraes, que falava de três daqueles seres leves, levianos: Vinícius, Otto e Antônio Maria. Era o texto de uma entrevista dada por Vinícius ao Otto, para o Jornal da Globo, quando esse era também um jornal mais leve. Aliás, quando a televisão era mais leve, quando o pais era mais leve. Quando éramos mais leves e não sabíamos.
Vinícius narrou ao Otto que às vezes ele saía da boate Sacha’s de madrugada com o Antônio Maria e ficavam os dois andando pelo Leblon para farejar com curiosidade canina que caminhos os cachorros vadios da madrugada seguiam. Vejam, houve um tempo em que se podia andar angelicamente de madrugada pelas ruas do país para acompanhar franciscanamente cães vadios. E assim, chegaram ambos a Copacabana onde, de repente, viram um estranho aglomerado de pessoas na areia, às seis da manhã. Pensaram que era afogamento, mas perceberam que o grupo levantava ao mesmo tempo as pernas ou os braços. Eram ginastas.
Perplexos, Maria e Vinicius se dizem:-Devem ser nórdicos! E Maria que chamava sempre Vinícius de Poesia, diz:- “Poesia, vamos fazer aqui um juramento”. Qual juramento, indaga Vinícius. E Maria: “Vamos jurar que nós nunca faremos um gesto desnecessário”...
Foi uma geração de frasistas geniais. Não era só o Otto, que recebeu de Nelson Rodrigues a alcunha de “genial frasista de São João del Rei”. Eram todos frasistas. A vida, uma amizade, um amor por uma frase. Rubem Braga que vivia tartamudeando palavras, não pesava nada. E um dia quando alguém, talvez Danuza Leão, falava umas coisas pesadas sobre um ex-amante, Rubem advertiu: “Não cuspa no prato que te comeu”.
Essas pessoas eram muito o espírito de uma geração, de uma época do Rio e do Brasil. Também com um presidente leve como Juscelino, que de tão leve vivia valsando e que botou em aviões uma cidade inteira levando-a para o planalto central, com ele tudo ficava mais fácil e mais leve.
Dedico esta crônica de Affonso Romano aos meus amigos blogueiros que sempre tem uma palavra de carinho.Obrigada!

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011


“O circo é uma pequenina arena fechada de esquecimento. Por algum tempo permite que nos percamos, nos dissolvamos em deslumbramento e felicidade, que sejamos transportados pelo mistério. Saímos estonteados, tristes e horrorizados pela face cotidiana do mundo. Porém o velho mundo de todos os dias, o mundo que achamos ser muito nosso conhecido, é o único mundo, e é um mundo de mágica, de inexaurível mágica. Assim como o palhaço, prosseguimos de um quadro para outro, sempre fingindo, sempre adiando o grande acontecimento. Morremos lutando para nascer. Jamais fomos nascidos, jamais nascemos. Estamos sempre no processo de vir a ser, sempre separados e isolados. Do lado de fora para sempre.”
(*Henry Miller, O Sorriso ao Pé da Escada, Editora Salamandra, 1979.)

sábado, 15 de janeiro de 2011

A gente precisa se ver mais
Meu amigo realizou o sonho de uma nova e bela casa e estamos, alguns casais e amigos, ali, para jantar e conversar. Matar saudades. Vivemos as peripécias dos anos 60, aquela coisa dos hippies, da utopia e da repres¬são. Estamos já de cabelos brancos, os que têm cabelos. De óculos. Falamos de filhos, de netos, de cachorros. São todos, de alguma maneira, bem-sucedidos em suas profissões. E, naturalmente, falamos mal do governo. Deste ou de qualquer outro.Alguns foram viver no estrangeiro exilados, outros foram para estudar. Mas voltamos. E, no clima amigável da conversação solta, a memória vai se aquecendo, os fatos vão ressurgindo, e, de repente, abole-se o tempo, confunde-se o ontem e o hoje. É tudo celebração. Celebração da vida vivida como um filme entrecortado que tivesse tido vários diretores.


- Onde estava você quando mataram Kennedy?- Onde estava você quando Getúlio se matou?- Onde estava você em abril de 64?- Where were you when they crucifica My Lord?Quando saem todos, lá pelas duas da manhã, uma frase circula no ar: "A gente precisa se ver mais". A gente se promete telefonar, marcar encontro, enfim, "se ver mais". Frase banal. No entanto, penso em como é diferente quando falada entre jovens. Aliás, jovem não fala assim. Diz: "Cara, pó! Você sumiu! Vamos no apê de fulana hoje, vai rolar um agito legal lá." Ou seja, os jovens marcam encontros para dominar o espaço. Incorporados às tribos noturnas, ficam zanzando de um bar para outro, de uma praia para outra, de um esporte para outro, conferindo espacialmente o que está ocorrendo em outros lugares. Os jovens estão desbravando corpos, e para eles o mundo é uma coisa muito ampla e distante, algo que começa depois do círculo de giz narcísico que os contém.Entre pessoas maduras, é diferente.

Desbrava-se o conhecido. O conhecimento é re-conhecimento. Não é o espaço, o tempo é que importa. Estar juntos é como estar ao redor de uma fogueira recontando a própria vida. Isto se parece também com guerreiros meio exaustos, com meia glória apenas, contando fragmentos de uma batalha ganha e perdida. E já que os presentes viveram experiências semelhantes, um é a memória do outro, o espelho do outro. É um exercício de reunir fragmentos de vida, reachar em nós a imagem de ontem e reter um pouco o presente que se esvai. Tem, de certo modo, o sentido de carpe diem. Um carpe diem meio retroativo, olhando o retrovisor. Estamos curtindo o presente densamente, como quem toma um velho e bom vinho.Mas há algo mais além da constatação de que os jovens vivem mais no espaço e os mais velhos vivem mais no tempo. Para os mais idosos nessas reuniões, a própria linguagem tem outra função.


Linguisticamente, os jovens têm mais uma fala denotativa e fática, cheia de exclamações, interjeições, poucas palavras. Não é uma linguagem dissertativa prenhe de memórias, reverberando muitas conotações como proustianamente é o caso dos adultos. O jovem conversa sobre o presente e faz rápidas alusões ao futuro. O adulto conversa retroativamente. O passado cresce continuamente, ilumina o presente e delega aos outros o futuro."A gente precisa se ver mais" significa também que nosso tempo está se esgotando, e reencontrar-se é, por um instante, conseguir suspender o tempo, povoar, alargar mais a própria vida. Parece que cada um tem uma mochila, uma bagagem qualquer, e que vai abrindo esse farnel de lembranças a ser servido na mesa comum.Essa coisa de estar juntos, vou dizer, nem precisa ser algo muito palrador, muito risonho, festivo. Existe um tipo de companheirismo silencioso, tipo cinema mudo, ou, mais pateticamente, tipo diálogo mudo de sombras. Se alguém quiser ficar calado ali, pode.Uma vez li que Samuel Beckett e não sei mais quem costumavam se sentar num café em Paris e ficar ali silenciosos madrugada adentro olhando, para onde? Para fora e para dentro, num silêncio estranhíssimo. Quer dizer, calados, se faziam companhia. Um animado papo silencioso.

Lembram-se daquela canção do Paulinho da Viola em que duas pessoas se cruzam rapidamente pela rua e vão prometendo se ver, se telefonar, enfim, reunir o que a vida dispersa e fragmenta?Pois é, a gente precisa se ver mais...
(Affonso Romano de Sant’Anna ,Tempo de delicadeza)
Recadinho para algumas amigas queridíssimas : Beth G., Adriane F., Adriane B., Estela F. , Glórinha, Bel F. , Regina B., Rosinha L., Carmem M,karina C.,
A gente precisa se ver mais...bjs

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

foto: Eliete Cascaldi

“Nenhum homem é uma ilha, sozinho em si mesmo; cada homem é parte do continente, parte do todo; se um seixo for levado pelo mar, a Europa fica menor, como se fosse um promontório, assim como se fosse uma parte de seus amigos ou mesmo sua;
a morte de qualquer homem me diminui, porque eu sou parte da humanidade; e por isso, nunca procure saber por quem os sinos dobram, eles dobram por ti”.
John Donne, poeta inglês do século XVI
Oremos pelos nossos irmãos que vivem o desespero das enchentes.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011


"Nenhum ser humano é capaz de esconder um segredo.
Se a boca se cala, falam as pontas dos dedos."

Sigmund Freud

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011


na hora de pôr a mesa éramos cinco:
o meu pai,a minha mãe, as minhas irmãs
e eu. depois, a minha irmã mais velha
casou-se. depois, a minha irmã mais nova
casou-se. depois, o meu pai morreu. hoje
na hora de pôr a mesa, somos cinco,
menos a minha irmã mais velha que está
na casa dela, menos a minha irmã mais
nova que está na casa dela, menos o meu
pai, menos a minha mãe viúva. cada um
deles é um lugar vazio nesta mesa onde
como sozinho. mas irão estar sempre aqui.
na hora de pôr a mesa, seremos sempre cinco.
enquanto um de nós estiver vivo, seremos
sempre cinco.
José Luís Peixoto (Galveias, Ponte de Sor, Setembro de 1974) Poeta, romancista, dramaturgo.

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Achei esta crônica muito interessante:divertida e ...
O homem que casou com sua mão direita
Luis Fernando Veríssimo

A verdade era que Herculano encontrara na sua mão direita o que nunca encontrara numa mulher.O Herculano era um homem sério, o que tornava suas esquisitices ainda mais divertidas para o grupo. Mesmo quando não estava na roda, o Herculano era assunto da turma. Volta e meia, alguém chegava com uma história nova do amigo, sempre prefaciada com a frase:– Sabem a última do Herculano?Pois a última do Herculano ele mesmo anunciou, um dia, ao chegar no bar:– Pedi a minha mão em casamento.– O quê?!– Você vai casar com você mesmo?– Não, só com a minha mão. Esta.
E Herculano levantou sua mão direita. A noiva abanou para todos na mesa.Herculano explicou que não tinha sido uma decisão súbita e impensada. Ele e sua mão eram ligados desde pequenos. Tinham se criado juntos. A partir da puberdade haviam começado a fazer sexo regularmente, mas nada sério. Coisa de adolescentes. Com o tempo, no entanto, o relacionamento mudara. Crescera uma real afeição entre os dois, que aos poucos se transformara em amor. A verdade, contou Herculano, era que encontrara na sua mão direita o que nunca encontrara numa mulher. Além de ser uma companheira constante que jamais o contrariava e fazia todas as suas vontades, era uma amante perfeita. Nenhuma mulher conseguia satisfazê-lo como sua mão direita– Me apaixonei, pronto – disse Herculano.
Herculano enumerou todas as vantagens de ter sua mão direita como esposa. Ela jamais lhe seria infiel. Ela jamais se recusaria, com um gesto que fosse, a fazer amor com ele. Estaria sempre pronta para o sexo, incapaz de alegar dor de cabeça, tendinite ou o que fosse. E não esperaria que ele fizesse conversa de neném antes e depois do ato, como algumas mulheres exigem. Sua mão direita não esperaria nada, não exigiria nada, seria uma amante – além de exímia nas artes do amor – silenciosa.Não era brincadeira. Herculano levou adiante o plano de casar com sua mão direita. Durante algum tempo – o tempo do noivado – a noiva usou duas alianças no seu dedo anular, uma dela e a outra do Herculano. Depois do casamento, a aliança do Herculano passou para a sua mão esquerda. Todos na roda queriam saber quando seria o casamento, quem seriam os padrinhos etc., mas Herculano informou que a cerimônia seria simples e sem testemunhas. Ele sabia que não seria difícil arranjar alguém para oficializá-la.
Hoje em dia, como se sabe, tem até padre casando surfistas em cima da prancha e pegando onda. Mas Herculano preferiu a discrição. A lua de mel foi em Cancun.E aconteceu uma coisa que ninguém poderia prever. O Herculano, que nunca fora disso, se revelou num grande ciumento. Continua frequentando a roda, mas, se desconfia que alguém está dando muita atenção à sua esposa, põe a mão no bolso.
Jornal: O Estado de São Paulo, 9/01/10

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011



O QUE FAZ VOCÊ FELIZ?

O que me faz feliz é mar, montanha e céu azul.
O vasinho com flores na janela e uma vaquinha pastando.
É arco-íris, o canto das cigarras e o barquinho sendo levado pela enxurrada.
O que me faz feliz é pipoca, biju, algodão doce e todas as guloseimas da infância.
É escutar: “mãe, cheguei”; música popular brasileira e a banda tocando no coreto.
Ah!, muitos livros para ler...
O que me faz feliz é visitar minha memória e lembrar do primeiro sapato de salto alto, do vestido de debutante e o dia do meu casamento.
E, é claro, do cheirinho de nenê.
Ah! tantas coisas vividas e outras que imagino viver ( ainda este ano), como por exemplo, o casamento da minha filha,me faz muito feliz.
(Eliete)

domingo, 9 de janeiro de 2011

O que faz você feliz?
Arnaldo Antunes


A lua, a praia, o mar
Uma rua, passear
Um doce, uma dança
Um beijo ou goiabada com queijo?
Afinal, o que faz você feliz?

Chocolate, paixão
Dormir cedo, acordar tarde
Arroz com feijão, matar a saudade
O aumento, a casa, o carro que você sempre quis
Ou são os sonhos que te fazem feliz?


Dormir na rede, matar a sede
Ler ou viver um romance
O que faz você feliz?
Um lápis, uma letra, uma conversa boaUm cafuné,
café com leite, rir a toa
Um pássaro, um parque, um chafariz
Ou será o choro que te faz feliz?
A pausa para pensar
Sentir o vento
Esquecer o tempo
O céu
O sol
Um som
A pessoa ou o lugar
Agora me diz o que faz você feliz?

O que faz você feliz?
aquela comida caseira,arroz com feijão
brincar a tarde inteira
o molho do macarrão
ou é o cheiro da cebola fritando que faz você feliz?

o papo com a vizinha,o bife, a batatinha
a goiabada com queijo
um doce ou um desejo
afinal o que faz você feliz?

O que faz você feliz?
ficar de bobeira
assaltar a geladeira
comer frango com a mão
tomar água na garrafa
passar azeite no pão
ou é namorar a noite inteira que faz você feliz?
rir e brindar a toa
um filme, uma conversa boa
fazer um dia normal virar uma noite especial
afinal, o que faz você feliz?

O que faz você feliz?
comer morango com a mão
por açúcar no abacate
brincar com melão, goiaba, romã, jabuticaba
ou é o gostinho de infância que faz você feliz?
cuspir sementes de melancia
falar besteira, ficar sem fazer nada
plantar bananeira, ou comer banana amassada?
afinal, o que faz você feliz?

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011


"Poesia serve exatamente para a mesma coisa que serve uma vaca no meio da calçada de uma agitada metrópole. Para alterar o curso do seu andar, para interromper um hábito, para evitar repetições, para provocar um estranhamento, para alegrar o seu dia, para fazê-lo pensar, para resgatá-lo do inferno que é viver todo santo dia sem nenhum assombro, sem nenhum encantamento"
Trecho de Veneno Antimonotonia de Martha Medeiros

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011


"É fácil abster-se de andar; o difícil é andar sem tocar na terra.

(...) Ouviste falar do vôo com asas, nunca porém do vôo sem asas. Ouviste falar do conhecimento que conhece e nunca do conhecimento que não conhece.Olha para a sala fechada, para o quarto vazio no qual nasce a claridade. A fortuna e a benção se acumulam onde há tranquilidade.Mas, se não és tranquilo, chama-se a isso estar sentado,mas correndo ao redor. Que teus olhos e ouvidos se comuniquem com o que há dentro de ti; deixa, porém, do lado de fora a mente e o conhecimento. Então até os deuses e os espirítos habitarão contigo, para não falar dos homens'.

Confúcio
O tao e a psicologia/Paulo V. Bloise

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

foto: estrada para Silvianópolis/M.G.

Ter o Eterno como uma terna esperança.
(Eliete Cascaldi)
...mas, é a eternidade que dá sentido à vida. Eternidade não é o tempo sem fim. Tempo sem fim é insurportável. Eternidade é o tempo completo, esse tempo do qual a gente diz:"Valeu a pena".
Rubem Alves

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

foto:Eliete Cascaldi Sobreiro (estrada para Silvianópolis/M.G.
Mia Couto , escritor moçambicano, com uma obra belíssima.
"Lhe concordo, doutor: sou eu que invento minhas doenças. Mas eu, velho e sozinho, o que posso fazer?
Estar doente é minha única maneira de provar
que estou vivo. É por isso que frequento o hospital, vezes e vezes, a exibir minhas maleitas.
Só nesses momentos, doutor, eu sou atendido.
Mal atendido, quase sempre. Mas nessa infinita fila de espera, me vem a ilusão de me vizinhar do mundo.
Os doentes são a minha família, o hospital é o meu tecto e o senhor é o meu pai, pai de todos os meus
pais".
(Mia Couto, In O Fio das Missangas)

sábado, 1 de janeiro de 2011

http://abstratosdenelsonaharon.blogspot.com/

ODISSÉIA 2.011
Janeiro é o primeiro mês do ano da segunda década do terceiro milênio.
Parece ser impossível, uma utopia!
Mas é realidade; estamos no ano de 2.011.
Não há naves espaciais, muito menos Barbarella, mas pode ser uma Odisséia.
Se desejarmos com força e agirmos com precisão, poderemos fazer, a partir de agora, uma jornada para dentro de nós mesmos, com o propósito de chegar aonde bate forte o nosso coração e, assim, resgatar não só o nosso bem-estar, mas alterar o mundo onde vivemos.
Podemos esperar que no decorrer do ano sejamos influenciados pelos conselhos do espírito prático (o mandatário dos tempos modernos) gritando em nossos ouvidos:
“Que besteira, precisamos cair na estrada com esperteza, ser práticos, objetivos, acreditar nas evidências e desconfiar de tudo e de todos, se quisermos vencer”.
Mas se formos só um pouquinho compreensivos com nossa alma, poderemos ouvir o espírito lírico, que soprará um trechinho da música de Gonzaguinha

http://abstratosdenelsonaharon.blogspot.com/

“É tão bonito quando a gente pisa firme
nessas linhas que estão nas palmas de nossas mãos.
É tão bonito quando a gente vai à vida
Nos caminhos onde bate, bem mais forte o coração”
Você já pensou que a sua vida, a minha e a de todos nós podem ser uma Odisséia?
Uma jornada fascinante e única, em que o herói, ao fazer o seu caminho, enfrentando todos os elementos necessários para o seu crescimento e amadurecimento, volta para casa vitorioso e forte , pois o seu poder não só o beneficia como também a seus semelhantes ?
Uma vida bem vivida e orientada pelo espírito do amor, (que segreda tão baixinho, como alerta, Cecília Meireles) é aquela que subordina os desejos egoístas em prol de um valor maior, que conta com doses frequentes de ousadia e paixão, e valoriza as amizades em qualquer ocasião.

Principalmente por poder voltar
a todos os lugares aonde já cheguei
pois lá deixei um prato de comida
um abraço amigo, um canto pra dormir e sonhar”

É urgente que façamos deste ano, um ano NOVO de verdade; que nossos desejos de harmonia, paz e unidade se concretizem em ações , pois a vida convoca-nos à grande lição:
“Aprendi que se depende sempre
de tanta , muita, diferente gente
toda pessoa sempre é as marcas
das lições diárias de outras pessoas.
E é tão bonito a gente entende
que a gente é tanta gente aonde quer que a gente vá
E é tão bonito quando a gente sente
que nunca está sozinho por mais que pense estar”.

A vida como uma Odisséia é quando o caminho transfigura-nos e passamos a compreender que não viajamos sozinhos. Que o nosso bem- estar está intimamente atrelado ao bem-estar do outro.
O caminho transfigura-nos quando não somos dominados pelo espírito da hipocrisia que nos faz falar o que não sentimos, fazer o que não preconizamos e calar quando deveríamos berrar.
O caminho transfigura-nos quando não somos dominados pelo espírito prático e utilitário, cujo valor está no uso e benefício de algo ou alguém, e no estabelecimento de relações frias e distantes.
O caminho transfigura-nos quando passamos a viver nossos papéis sociais com responsabilidade e envolvimento emocional profundo, para que possam ser certidões do nosso comprometimento verdadeiro e humano com nossos semelhantes.
O ano de 2011 só será um ano realmente NOVO , quando inaugurarmos um novo calendário - o do Tempo da Graça , cuja pauta seja o amor, prevalecendo em todos os dias comuns e não apenas em datas especiais e que o marcador seja a honestidade em cada um de nós.
(Eliete Cascaldi)
Inspiração: Letra e Música: Caminhos do coração (Gonzaguinha)


Apontadora de Idéias

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"A senhora me desculpe, mas no momento não tenho muita certeza. Quer dizer, eu sei quem eu era quando acordei hoje de manhã, mas já mudei uma porção de vezes desde que isso aconteceu. (...) Receio que não possa me explicar, Dona Lagarta, porque é justamente aí que está o problema. Posso explicar uma porção de coisas... Mas não posso explicar a mim mesma." (Lewis Carroll)

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