domingo, 30 de maio de 2010


A ERA DA CORRERIA

Nós bebemos demais, fumamos demais, gastamos sem critérios, dirigimos rápido demais, ficamos acordados até muito mais tarde, acordamos muito cansados, lemos muito pouco, assistimos TV demais e rezamos raramente. Multiplicamos nossos bens, mas reduzimos nossos valores. Nós falamos demais, amamos raramente, odiamos freqUentemente. Aprendemos a sobreviver, mas não a viver; adicionamos anos à nossa vida e não vida aos nossos anos. Fomos e voltamos à Lua, mas temos dificuldade em cruzar a rua e encontrar um novo vizinho. Conquistamos o espaço, mas não o nosso próprio.Fizemos muitas coisas maiores, mas pouquíssimas melhores. Limpamos o ar, mas poluímos a alma; dominamos o átomo, mas não nosso preconceito; escrevemos mais, mas aprendemos menos; planejamos mais, mas realizamos menos.Aprendemos a nos apressar e não, a esperar.Construímos mais computadores para armazenar mais informação, produzir mais cópias do que nunca, mas nos comunicamos menos. Estamos na era do 'fast-food' e da digestão lenta; do homem grande de caráter pequeno; lucros acentuados e relações vazias.Essa é a era de dois empregos, vários divórcios, casas chiques e lares despedaçados. Essa é a era das viagens rápidas, fraldas e moral descartáveis, das rapidinhas, dos cérebros ocos e das pílulas 'mágicas'. Um momento de muita coisa na vitrine e muito pouco na despensa. Uma era que leva essa carta a você, e uma era que te permite dividir essa reflexão ou simplesmente clicar 'delete'.Lembre-se de passar tempo com as pessoas que ama, pois elas não estarão por aqui para sempre. Lembre-se dar um abraço carinhoso num amigo, pois não lhe custa um centavo sequer. Lembre-se de dizer 'eu te amo' à sua companheira (o) e às pessoas que ama, mas, em primeiro lugar, ame... Ame muito.
GEORGE CARLIN

sexta-feira, 28 de maio de 2010


ESCONDE –ESCONDE
O psicanalista inglês Donald W. Winnicott expressou certa vez o seguinte pensamento: “Esconder-se é um prazer, não ser encontrado é um desastre”.
Penso que, nesta frase, encontram-se aspectos fundamentais para nossas relações pessoais.
Na infância, com certeza, todos nós brincamos de esconde-
-esconde. Buscávamos lugares difíceis, como esconderijos para que ninguém nos achasse, e assim nos sentíamos vitoriosos. Mas, se depois de algum tempo, ninguém viesse à nossa procura , íamos sentindo medo ou tristeza e passávamos a acreditar que as pessoas haviam-nos esquecido. Assim, aquela brincadeira tornava-se um desastre.
Acontece de pessoas já adultas, sem muita consciência do mecanismo utilizado, continuarem a “brincar” de esconde-
- esconde com seus amigos. Distanciam-se de pessoas de que gostam, agora, não mais como diversão, e sim com o propósito de “checar” se elas serão procuradas. Acontece que o” Outro” com quem estas pessoas “jogam”, não tem a mínima ideia dos seus propósitos, e entendem o sinal emitido (afastamento) como uma manifestação do desejo de ficar só, e assim não buscam a aproximação, respeitando o companheiro.
Instala-se, assim, um desastre.
Este mecanismo tende a repetir-se por mais vezes, e o resultado acaba sendo o isolamento, esquecimento ou mesmo o fim de uma relação prazerosa. Terminam-se amizades que eram importantes, sobrando aos envolvidos grandes mágoas e , muitas vezes, a certeza errônea de que as pessoas não são amigas e muito menos confiáveis.
É a mais pura insensatez, pois a pessoa que assim se comporta , não percebe que suas atitudes expressam o contrário dos seus desejos , e estará sempre tecendo teias que acabam por isolá-la das pessoas queridas.
A realização pessoal só é alcançada quando se é capaz de construir o lugar do singular e do coletivo em nossas vidas.
Esta construção requer atenção contínua e autoconhecimento, para agir sem ambiguidades, pois ” desejo entendido é desejo atendido”.
Muitas vezes, acabamos perdendo pessoas e situações valiosas como consequência das incoerências das atitudes e da baixa autoestima que portamos .
autoria: Eliete T. Cascaldi Sobreiro




segunda-feira, 24 de maio de 2010


O QUE EU QUERO E SOBREQUERO
é uma expressão de Guimarães Rosa e que tomo emprestada para falar do meu maior desejo.
Se uma fada madrinha aparecesse com sua varinha de condão, e me desse a possibilidade de realizar um desejo, não teria a menor dúvida e rapidamente responderia: O que mais quero é tocar em frente a minha vida com valentia e ser feliz sem muitas garantias.
O que mais quero é não ser o meu maior obstáculo, frente às lições do caminho, e ter coragem - seguir em frente apesar dos medos.
O que mais quero e sobrequero é ser como o velho boiadeiro, que leva sua boiada (todas as experiências boas e ruins) sem pressa, com um sorriso, forte e feliz, aceitando e aprendendo com cada passo e escorregadela que vier dar pelo caminho.
O que eu quero é não recuar frente às manhas da vida, manter-me firme e não permitir que a descrença more dentro de mim.
O que eu quero e sobrequero é não produzir pensamentos catastróficos constantemente, para que a paz possa vir em meu auxílio e ritmar o meu coração.
É encontrar um velho boiadeiro que me ajude quando nada sei e que eu também possa, com minha experiência, ser um velho boiadeiro para quem por mim passar.
O que eu quero e sobrequero é não me afastar de Deus e guiar-me sempre por Sua Palavra.
Tocar em frente e compor a própria história, sei bem que nenhuma fada irá me proporcionar, pois essa estrada é um processo de construção particular, intenso e profundo, que se faz continuamente por meio do autoconhecimento .
Cumprir a vida é ser estrada; viver intensamente cada passo dado, não se fechar às possibilidades do caminho, ter um olhar mais generoso para com as pessoas e saber lidar com a própria verdade.
O que eu quero é aprender a amar para poder pulsar e que, antes de morrer, eu saiba viver.
...Cada ser em si carrega o dom se ser capaz e ser feliz.

Agora é a sua vez, pare, pense e responda com toda sinceridade: O que eu quero e sobrequero.........................
autoria: Eliete T. Cascaldi Sobreiro
Inspiração: Tocando em frente/Almir Sater e Renato Teixeira

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Perder a Viagem
Você pede ao patrão para sair mais cedo do trabalho, aí pega um ônibus lotado, vai para um consultório médico que fica no outro lado da cidade, gasta seus trocados, seu tempo e seu humor e, ao chegar, esbaforido e atrasado, descobre que sua hora, na verdade, está marcada para semana que vem. Sinto muito, você perdeu a viagem. Todo mundo já passou por uma situação assim, de estar no lugar errado e na hora errada por pura distração. Acontecendo só de vez em quando, tudo bem, vai pra conta dos vacilos comuns a qualquer mortal. O problema é quando você se sente perdendo a viagem todos os dias. Todinhos. É o caso daqueles que ainda não entenderam o que estão fazendo aqui. Estão perdendo a viagem aqueles que não se comprometem com nada: nem com um ofício, nem com um relacionamento, nem com as próprias opiniões. Estão sempre flanando, flutuando, pousando em sentimento nenhum, brigando por idéia nenhuma, jamais se responsabilizando pelo que fazem, pois nada fazem. Respirar já é para eles tarefa árdua e suficiente. E os dias passam, e eles passam, e nada fica registrado, nada que valha a pena lembrar. Estão perdendo a viagem aqueles que, em vez de tratarem de viver, ficam patrulhando a existência alheia, decretando o que é certo e errado para os outros, não tolerando formas de vida que não sejam padronizadas, gastando suas bocas com fofocas, seus olhos com voyeurismo, sem dedicar o mesmo empenho e tempo para si mesmo. Estão perdendo a viagem aqueles preguiçosos que levam semanas até dar um telefonema, que levam meses até concluir a leitura de um livro, que levam anos até decidir procurar um amigo. Pessoas que acham tudo cansativo, que acreditam que tudo pode esperar, que todos lhe perdoarão a ausência e o descaso. Estão perdendo a viagem aqueles que não sabem de onde vieram nem tentam descobrir. Que não sabem para onde ir e nem tentam encontrar um caminho. Aqueles para quem a tele visão pode tranqüilamente substituir as emoções. Estão perdendo a viagem todos aqueles que se entregam de mão beijada às garras afiadas do tédio.

recebi por e-mail constando que esta reflexão é de Martha Medeiros

quarta-feira, 19 de maio de 2010

QUEM SABE UM DIA
Quem sabe um dia
Quem sabe um seremos
Quem sabe um viveremos
Quem sabe um morreremos !
Quem é que
Quem é macho
Quem é fêmea
Quem é humano ,apenas!
Sabe amar
Sabe de mim e de si
Sabe de nós
Sabe Ser Um!
Um dia
Um mês
Um ano
Um (a) vida!
Sentir primeiro, pensar depois
Perdoar primeiro, julgar depoios
Amar primeiro, educar depois
Esquecer primeiro, aprender depois.
Libertar primeiro, ensinar depois
Alimentar primeiro,cantar depois
Possuir primeiro, contemplar depois
Agir primeiro, julgar depois.
Navegar primeiro, aportar depois
viver primeiro, morrer depois.
MÁRIO QUINTANA

domingo, 16 de maio de 2010


NÓS NO PAÍS DA ÉTICA LIGHT
Nós, brasileiros, vivemos o risco de nos tornar um povo blasé. Não passa mês sem a revelação de práticas pouco ortodoxas de nossos homens públicos. Um deles conseguiu do Judiciário, faz um ano, a censura a este jornal. Há dias, soubemos que um dirigente da área de segurança pública mantém amizade e talvez negócios com um suspeito de crimes. Tenho sempre sustentado que a corrupção não aumentou, o que seria lastimável, e sim que cresceram a percepção da corrupção e a aversão a ela, o que é positivo. Devo confessar que esta convicção é o que me poupa de ser blasé. Permite-me esperar que, mesmo num prazo mais demorado do que desejaria, este país se torne um lugar sem miséria, sem injustiça social, sem injustiça, em suma, um país decente.
O homem público obedece a uma ética diferente da privada? Esta discussão é crucial. Fernando Henrique Cardoso citava Max Weber: enquanto o indivíduo particular - qualquer um de nós - pode pautar suas ações pela moral de princípios, por valores como os dez mandamentos, o político tem de considerar os resultados que sua ação terá. A ética do político seria de resultados, a dos cidadãos seria uma ética de valores ou princípios. FHC tem razão, no sentido de que não basta o político ser honesto: precisa agir para melhorar nossa vida. Mas o problema é que, ouvindo isso, supomos que o homem público tenha uma ética com deságio. Para governar, ele precisaria unir-se a políticos fisiológicos. Na melhor das hipóteses, nossos políticos honestos viveriam uma opção trágica: ou se mantêm honestos e não conseguem aprovar nada que melhore o Brasil, ou cedem a seus aliados ruins - cedendo o menos possível - e aí asseguram algum avanço econômico, social. É um cálculo penoso de custo-benefício. Estou convicto de que os políticos éticos, que os há, vivem essa escolha de sofia.
Mas não é pouco achar que a vida pública segue uma ética reduzida, light, empobrecida? E se o político devesse ser mais ético, e não menos, que o cidadão privado? Posso estar sendo otimista demais, mas a meu ver quem sinaliza que tem preço acaba, sim, tendo preço. Mostra que pode ser comprado. Já um homem público, em qualquer poder que seja da República, que se mostre honesto estará mais afinado com os sinais de um tempo que parece prezar a transparência e desprezar a corrupção. Pode ser esta a base que falta para finalmente construirmos nossa república: o regime que valoriza a res publica, a coisa pública, o bem comum. A história dispõe de exemplos neste rumo, talvez raros mas veementes - políticos que apelam ao povo, à opinião pública, quando algo no seu meio se mostra podre, errado, inaceitável.
Dá para aceitar que a proporção de processados, entre os políticos, seja maior do que entre os cidadãos que eles representam? Pouco após o fim da ditadura, um cidadão ofendeu o jornalista Sergio Cabral (pai), dizendo que o parlamento estava cheio de corruptos. Cabral respondeu com verve: "Tenha certeza de que todos os parlamentares foram eleitos e, portanto, todos os cidadãos estão representados por eles, inclusive o senhor". Infelizmente, porém, esse inteligente lembrete - de que os eleitos nos representam - hoje só conta metade da história. É verdade que quem elege ladrões é o povo. Mas também é fato que o sistema é organizado de modo que, às pessoas dignas, a política não soa como a carreira mais adequada. Será preciso muito para mudar isso. Um passo importante pode ser dado com a lei da Ficha Limpa. Também é boa a decisão da Justiça de divulgar na internet o prontuário dos candidatos. Mas o fundamental é não desistir da política, é exigir que os eleitos se pautem por valores que sejam os nossos. Acostumamo-nos a viver num país paralelo, um Brasil "do B". Os leitores deste jornal pagam impostos para sustentar a saúde, a educação e a segurança públicas, mas também pagam um seguro-saúde, uma escola particular e um segurança para sua rua ou prédio. Ou seja, pagamos duas vezes a mesma coisa. Isso se justifica? Como não se confia plenamente no Estado, centenas de milhares de brasileiros são voluntários em ONGs. É uma bela atitude - que vai mudar o Brasil. Mas por que aceitamos que o Estado - municipal, estadual ou federal - cumpra só parte de suas tarefas? Por que admitimos essa duplicação de nosso país, um que elegemos e pagamos mas em que não acreditamos, outro que também pagamos e no qual acreditamos mais? O país do Estado e o país da sociedade têm de ser um só. A decepção com os políticos é cara: ela nos força a trabalhar dobrado para, no fim das contas, termos uma sociedade e uma república incompletas.
RENATO JANINE RIBEIRO É PROFESSOR TITULAR DE ÉTICA E FILOSOFIA POLÍTICA DA USP 
Tópicos:
, Suplementos, Aliás- O Estado de S.Paulo (16/05/2010)

Grifo meu

sexta-feira, 14 de maio de 2010

O perdão, quando bem compreendido, é um instrumento de cura. Frequentemente ficamos doentes porque não perdoamos e o rancor e a cólera nos corroem o fígado e os rins. A questão é como manter juntos o perdão e a justiça, (...) o olho da verdade e o olho da misericórdia.
Creio que não devemos perdoar muito rápido. É necessário, antes de perdoarmos, que expressemos o sofrimento pelo que nos foi feito e a isso chamo justiça. O sinal-da-cruz, tal como era feito nos doze primeiros séculos de nossa era, expressava bem esse sentimento. Começava-se por uma linha vertical, da testa ao peito, em seguida levava-se a mão ao ombro direito e depois ao esquerdo (atualmente faz-se o contrário), simbolizando a passagem da justiça para a misericórdia. Começando sempre pela justiça, exigindo que fosse reconhecido o mal que foi feito, o inaceitável de certas situações e de certas violências. Portanto, o pedido de justiça é essencial. Mas é essencial, também, ir além da justiça, em direção à misericórdia, em direção ao perdão, em direção ao lado que é o lado do coração.


O que é o perdão? O perdão é não aprisionar o outro nas conseqüências negativas de seus atos..
(...) Como fazer para que este perdão se torne algo verdadeiro? Platão dizia: “Aquele que tudo compreende, tudo perdoa”. Aquele que se conhece a si mesmo, com suas ambiguidades, pode compreender o outro em suas sombras. Portanto, inicialmente, o perdão pode ser uma questão de inteligência, de compreensão. Perdoar você significa que eu o compreendo, mas não quer dizer que (...) o que você fez é bom. Compreendo que você é um ser humano, que é capaz de me enganar como eu próprio faria se, provavelmente, estivesse nas mesmas condições.

A atitude de Cristo aos que queriam lapidar a mulher adúltera é: “Aquele que estiver sem pecado atire a primeira pedra”. Lembrem-se como aos poucos todos se retiram, do mais velho ao mais jovem. Nesse caso Jesus se serve da Sagrada Escritura, não para mostrar aos outros como eles são pecadores, mas para fazê-la de espelho onde eles podem ver suas fraquezas, suas falhas e compreender as dos outros, não os aprisionando nas conseqüências negativas de seus atos.

Além de perdoar com a cabeça é preciso perdoar com o coração e, vocês sabem, o corpo é o último que perdoa. Se alguém lhes fez mal, se lhes causou sofrimento, vocês podem tê-lo perdoado com a “cabeça”, tê-lo compreendido com o coração, pensar que o passado passou. Entretanto, quando essa pessoa se aproxima, seu corpo se crispa e se enrijece mostrando bem que ele ainda não perdoou, que muitas memórias estão ainda bem guardadas.

Creio que é verdadeiramente uma graça quando nos encontramos perto de alguém que nos tenha feito mal e sentimos nosso corpo calmo, nosso coração límpido. Podemos dizer que, verdadeiramente, estamos curados. Por isso, creio que o perdão é uma prática de cura.

No Pai-nosso se diz: Perdoai-nos do mesmo modo como perdoamos. Como se o dom da vida só pudesse circular em nós dependendo de nossa capacidade de perdão. Se não perdoamos ficamos prisioneiros, bloqueados em uma situação, em um rancor, e a vida não pode circular. Perdoar não é fácil...
Assim, é preciso lembrar que, cada vez que perdoamos depois de termos pedido justiça, acordamos para uma dimensão divina de nós mesmos. O perdão é um exercício de divinização onde o humano se torna divino. Continuando humano, temos que reclamar justiça e, quando for possível, dizer o que foi mau ou destrutivo para nós e pedir uma reparação. Também somos capazes de misericórdia e de perdão. Portanto, é preciso que mantenhamos juntas a justiça e a misericórdia. São dois olhos, às vezes, estrábicos. Podemos esquecer a justiça e nosso perdão ser superficial, podemos esquecer o perdão e partimos para uma justiça inquisitorial.

Do livro O Corpo e seus símbolos, Jean Yves Leloup,1998

quarta-feira, 12 de maio de 2010


MINHA CRIANÇA:
Peço licença para falar na minha criança, a que mora aqui dentro e não me abandonará jamais. Talvez com a morte eu até regresse a ela. Os quase setenta anos que dela me separam não a removem. Ela ali está, magra e tímida, a me olhar e ditar comportamentos e reações.
Minha criança esteve em todos os meus filhos e aparece no meus sete netos. Ela se refaz da morte da irmã e abre os olhos para o mundo, com a certeza de que veio ao mundo para alguma missão, embora sempre se considere inferior ao tamanho da mesma. Minha criança sente enorme saudade de pai e da mãe com quem o adulto já não conta salvo no exemplo, na saudade e nas orações quando me domina uma fugidia sensação de estarem, incorpóreos, a meu lado, mas sem se manifestarem.
Minha criança possui incomensuráveis solidões diante do mistério do infinito.
Ainda recua diante do violento, embora não o tema, e ainda se infiltra em episódios de distração e inocência inexplicáveis num homem com minha carga de vivências. Minha criança ainda gosta de abraço caloroso, proteções misteriosas e de um modo de rezar que o adulto nunca mais conseguiu tais a entrega e a total confiança no Mistério e na proteção de Deus.
Minha criança carrega o melhor de mim, é portadora de meu modo triste de falar de coisas alegres e de algum susto misterioso sempre que se lhe impõe alguma expectativa d enfermidade. Minha criança é inteira, mansa, bondosa e linda. Eu a amo, preservo, e dou boas gargalhadas quando a vejo infiltrar-se nas graves decisões de algumas de minhas responsabilidades adultas. Ninguém a vê, salvo eu. Ninguém a acaricia, salvo eu, que a estimo, procuro e admiro mais a cada dia e com quem converso histórias infinitas, que somente a imaginação pode conceber no universo maravilhoso da fabulação interior e solitária.
Diariamente passeio com minha criança e estou muito feliz por cumprimentá-la, levar-lhe balas, nuvens, aquele cão da meninice, as canções de minha mãe e os carinhos de meu pai, levar-lhe os presentes que ganhava de meu padrinho e toda a enorme vontade de Ser que então adivinhava para a minha vida. Vida que chegou, ameaça passar, e da qual não me arrependo. Minha criança adivinhou em seus sonhos o adulto que eu queria ser. E traz alegria e esperanças à minha idade atual. Hoje sou, há muito tempo, o adulto que sonhei ser. Talvez com menos tensões, mas igualzinho em meu modo de amar a vida.
Arthur da Távola

terça-feira, 11 de maio de 2010


Depois de uma grande tempestade, o menino que estava passando férias na casa do seu avô, o chamou para a varanda e falou:
Vovô corre aqui! Explica-me como essa figueira, árvore frondosa e imensa, que precisava de quatro homens para balançar seu tronco se quebrou, caiu com o vento e com a chuva… este bambu é tão fraco e continua de pé?
Filho, o bambu permanece em pé porque teve a humildade de se curvar na hora da tempestade. A figueira quis enfrentar o vento. O bambu nos ensina sete coisas. Se você tiver a grandeza e a humildade dele, vai experimentar o triunfo da paz em seu coração.
A primeira verdade que o bambu nos ensina, e a mais importante, é a humildade diante dos problemas, das dificuldades.
Eu não me curvo diante do problema e da dificuldade, mas diante daquele, o único, o princípio da paz, aquele que me chama, que é o Senhor.

Segunda verdade: o bambu cria raízes profundas. É muito difícil arrancar um bambu, pois o que ele tem para cima ele tem para baixo também. Você precisa aprofundar a cada dia suas raízes em Deus na oração.

Terceira verdade: Você já viu um pé de bambu sozinho? Apenas quando é novo, mas antes de crescer ele permite que nasça outros a seu lado (como no cooperativismo). Sabe que vai precisar deles. Eles estão sempre grudados uns nos outros, tanto que de longe parecem com uma árvore. Às vezes tentamos arrancar um bambu lá de dentro, cortamos e não conseguimos. Os animais mais frágeis vivem em bandos, para que desse modo se livrem dos predadores.

A quarta verdade que o bambu nos ensina é não criar galhos. Como tem a meta no alto e vive em moita, comunidade, o bambu não se permite criar galhos. Nós perdemos muito tempo na vida tentando proteger nossos galhos, coisas insignificantes que damos um valor inestimável. Para ganhar, é preciso perder tudo aquilo que nos impede de subirmos suavemente.

A quinta verdade é que o bambu é cheio de “nós” (e não de eu’s). Como ele é oco, sabe que se crescesse sem nós seria muito fraco. Os nós são os problemas e as dificuldades que superamos. Os nós são as pessoas que nos ajudam, aqueles que estão próximos e acabam sendo força nos momentos difíceis. Não devemos pedir a Deus que nos afaste dos problemas e dos sofrimentos. Eles são nossos melhores professores, se soubermos aprender com eles.

A sexta verdade é que o bambu é oco, vazio de si mesmo. Enquanto não nos esvaziarmos de tudo aquilo que nos preenche, que rouba nosso tempo, que tira nossa paz, não seremos felizes. Ser oco significa estar pronto para ser cheio do Espírito Santo.Por fim, a sétima lição que o bambu nos dá é exatamente o título do livro: ele só cresce para o alto. Ele busca as coisas do Alto. Essa é a sua meta.
Livro: Buscado as Coisas do Alto


segunda-feira, 10 de maio de 2010


Lar é onde se acende o lume e se partilha mesa e onde se dorme à noite o sono da infância.
Lar é onde se encontra a luz acesa quando se chega tarde.
Lar é onde os pequenos ruídos nos confortam: um estalar de madeiras, um ranger de degraus, um sussurrar de cortinas.
Lar é onde não se discute a posição dos quadros, como se eles ali estivessem desde o princípio dos tempos.
Lar é onde a ponta desfiada do tapete, a mancha de humidade no tecto, o pequeno defeito no caixilho, são imutáveis como uma assinatura conhecida.
Lar é onde os objectos têm vida própria e as paredes nos contam histórias.
Lar é onde cheira a bolos, a canela, a caramelo.
Lar é onde nos amam."
Rosa Lobato de Faria in "O Sétimo Véu"

quarta-feira, 5 de maio de 2010

UMA PAIXÃO
Você sabe o que é ter uma paixão, meu senhor?
Foi assim que aquele homem cambaleante chegou até o banco do jardim onde eu esperava a condução para ir para casa. Foi logo me interrogando. Assustei, é claro, afinal não o conhecia, e pensei que poderia ser um assalto.
Mas aos poucos fui sentindo-me tranquilo , e acalmei os pensamentos ao perceber que ele olhava diretamente para meus olhos, e sua feição era de profunda tristeza.
Cresceu dentro do meu peito uma ternura por aquele ser humano, e uma vontade enorme de conhecer a sua história.
E assim perdi o ônibus que me levaria mais rápido para casa, e ganhei boas reflexões para minhas noites de insônia.
Esse homem, ao questionar-me, sabia que eu não teria respostas às suas dúvidas e muito menos seria capaz de aliviar sua dor, mas precisava falar, pois só assim, quem sabe, a dor daria uma trégua .
Paixão, que bicho é esse que corrói a gente por dentro?
Que coisa é essa que tira todo nosso sossego, que joga com a gente de maneira tão cruel?
Sabe moço, eu amei desesperadamente uma mulher e sei que ela também me amou.
Vivemos dias maravilhosos e, sem exagero, chegamos muito perto do Paraíso. Era maravilhoso! Nada perturbava nossos dias. Tudo que existia de lindo ao nosso redor, desbotava, pois embriagávamos um no outro. Tomávamos maior “porre” de amor ! E, como cachaça, uma vez viciados, cada vez precisávamos mais e mais um do outro.
Até que um dia, aconteceu com a gente o que aconteceu com Adão e Eva. Deus perguntou-me: “Onde está sua Eva?
Meu coração estremeceu, minha pele ficou toda arrepiada; senti medo. Ela havia saído , fora fazer algumas compras, e disse-me que voltaria logo.
E aí, seu moço, ela não voltou. Uma bala perdida atravessou o peito do meu amor!
Agora, pergunto-lhe: O que faço com este amor que perambula dentro de mim, que não dorme, que não tem sossego , que quer encontrá-la, custe o que custar?
O que faço com a paixão que não consegue arrumar uma casa para morar? Que recusa aceitar que a morte capturou sua amada?Sou agora refém dessa paixão, que, tatuada em minhas vísceras, teima em não querer entender que tudo terminou.
Meu senhor, seu transporte chegou, segue seu caminho! Obrigado por escutar-me, ficarei aqui esperando a Lua apontar lá no céu, linda e resplandecente! Ela também espera pelo seu amado...


Paixão, desafio do mês de maio da Fábrica de Letras



A Luta pela Recordação

Os meus pensamentos foram-se afastando de mim, mas, chegado a um caminho acolhedor, repilo os tumultuosos pesares e detenho-me, de olhos fechados, enervado num aroma de afastamento que eu próprio fui conservando, na minha pequena luta contra a vida. Só vivi ontem.
Ele tem agora essa nudez à espera do que deseja, selo provisório que nos vai envelhecendo sem amor. Ontem é uma árvore de longas ramagens, e estou estendido à sua sombra, recordando.
De súbito, contemplo, surpreendido, longas caravanas de caminhantes que, chegados como eu a este caminho, com os olhos adormecidos na recordação, entoam canções e recordam. E algo me diz que mudaram para se deter, que falaram para se calar, que abriram os olhos atónitos ante a festa das estrelas para os fechar e recordar... Estendido neste novo caminho, com os olhos ávidos florescidos de afastamento, procuro em vão interceptar o rio do tempo que tremula sobre as minhas atitudes. Mas a água que consigo recolher fica aprisionada nos tanques ocultos do meu coração em que amanhã terão de se submergir as minhas velhas mãos solitárias...
Pablo Neruda, in 'Nasci para Nascer'

segunda-feira, 3 de maio de 2010


“As vidas das pessoas serão diferentes do que costumavam ser nos velhos tempos das carreiras à moda antiga, quando havia a expectativa de pleno emprego. A segurança não está mais incorporada ao mundo do trabalho, ou da educação, por sinal. As pessoas terão que tê-la consigo e dentro de si, o que significa que suas qualificações terão que ser transportáveis”.
Dahrendorf: sociólogo alemão

Apontadora de Idéias

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São Paulo, Brazil
"A senhora me desculpe, mas no momento não tenho muita certeza. Quer dizer, eu sei quem eu era quando acordei hoje de manhã, mas já mudei uma porção de vezes desde que isso aconteceu. (...) Receio que não possa me explicar, Dona Lagarta, porque é justamente aí que está o problema. Posso explicar uma porção de coisas... Mas não posso explicar a mim mesma." (Lewis Carroll)

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