CON-VERSO : UM PAPO REGADO A POESIA

De repente, não mais do que de repente, as coisas começam a desengajar-se.
È como se tocasse um despertador, de início baixinho e depois insistentemente, lembrando-nos que o tempo está passando rápido demais . O estranhamento frente ao espelho e aquelas conquistas tão queridas e arduamente buscadas, agora parecem boas mas não suficientes.
Além dessas chateações, ainda há as perguntinhas insolentes!

Por que é tão difícil colocar em prática o que acreditamos ser bom, necessário e essencial para nós?
Por que, mesmo possuidores de tantos sentimentos e emoções, optamos por vivê-los pobremente?
Por que, crescidos e conscientes das nossas capacidades, repetimos velhos padrões de comportamento, e insistimos em permanecer em situações ás vezes tão destrutivas?
Vários estudos indicam que a falta de alinhamento entre pensamento, palavra e ação, e que a distância entre a nossa essência e nossa existência resulta em perda de saúde e de paz.
Isso está acontecendo com muitos de nós.
Optando por viver distantes, estrangeiros de nós mesmos, muitas vezes como sonâmbulos, vamos empobrecendo-nos e perdendo a energia e a paixão.A paixão dá lugar ao dever que só aumenta, e sabemos muito bem que a motivação do "eu devo, é muito diferente do eu quero".
Pense agora com carinho:

A razão para tanta correria é necessidade real ou fruto de exigências neuróticas?
Há quanto tempo você não deita sobre a grama para ver com que as nuvens se parecem?
Qual foi a última vez que se surpreendeu?
Qual foi a última vez que se surpreendeu?
Indiferentes com o mundo em que vivemos, vamos aos poucos fechando-nos em relação a tudo, esterilizando sentimentos e gradativamente perdendo o viço e partindo para uma vida empobrecida e inexpressiva.
È a vivência do demoníaco" como escreve Clarice Lispector.
Vivendo atropeladamente e esperando ansiosamente, o final do dia, o final da semana, as férias, a aposentadoria, ou então esperando ganhar na loteria, alcançar sucesso, fama e dinheiro para poder viver o que consideramos uma vida com qualidade, somos nós:"pobres pássaros prisioneiros nas gaiolas do dever".
E,num determinado momento passamos a lamentar o que não vivemos...
Remorso
Remorso
"Às vezes uma dor me desespera
nestas ânsias e dúvidas em que ando
cismo e padeço neste outono, quando
cálculo o que perdi na primavera.
Versos e amores sufoquei calando
sem os gozar numa explosão sincera.
Ah! mais cem vidas! com que ardor quisera
mais viver, mais penar e amar cantando.
Sinto o que desperdicei na juventude,
choro neste começo de velhice.
Mártir da hipocrisia ou da virtude,
os beijos que não tive por tolices,
por timidez o que sofrer não pude
e por pudor os versos que não disse.
Olavo Bilac.