sábado, 24 de agosto de 2013

 
 
Minha Missão

Paulo César Pinheiro

Quando eu canto
É para aliviar meu pranto
E o pranto de quem já
Tanto sofreu
Quando eu canto
Estou sentindo a luz de um santo
Estou ajoelhando
Aos pés de Deus
Canto para anunciar o dia
Canto para amenizar a noite
Canto pra denunciar o açoite
Canto também contra a tirania
Canto porque numa melodia
Acendo no coração do povo
A esperança de um mundo novo
E a luta para se viver em paz!

Do poder da criação
Sou continuação
E quero agradecer
Foi ouvida minha súplica
Mensageiro sou da música
O meu canto é uma missão
Tem força de oração
E eu cumpro o meu dever
Aos que vivem a chorar
Eu vivo pra cantar
E canto pra viver

Quando eu canto, a morte me percorre
E eu solto um canto da garganta
Que a cigarra quando canta morre
E a madeira quando morre, canta!

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Eu penso assim...
 
imagem da internet
 
“Eu, por exemplo, gosto do cheiro dos livros. Gosto de interromper a leitura num trecho especialmente bonito e encostá-lo contra o peito, fechado, enquanto penso no que foi lido. Depois reabro e continuo a viagem. (…) Gosto do barulho das paginas sendo folheadas. Gosto das marcas de velhice que o livro vai ganhando: (…) a lombada descascando, o volume ficando meio ondulado com o manuseio. Tem gente que diz que uma casa sem cortinas é uma casa nua. Eu penso o mesmo de uma casa sem livros.”

terça-feira, 30 de julho de 2013

Férias – “Ócio Criativo”!


foto: Eliete T. Cascaldi Sobreiro
A demora para escrever um novo texto tem uma justificativa: as férias!! Vivemos uma época em que trabalhamos muito e nosso tempo é cada vez mais escasso. Por isto, nossas férias são sagradas, ou deveriam ser... pra mim, férias é época de descansar a mente, relaxar, deixar de lado as preocupações do dia a dia e se possível: viajar!
É revigorante conhecer lugares novos, pessoas diferentes, respirar novos ares. Nossos olhos estão acostumados com as mesmas paisagens, nossa convivência diária limita-se a círculo permanente de pessoas, assim nos habituamos aos mesmos assuntos, mesmas comidas, às mesmices. Não estou desvalorizando as nossas vidas, eu mesma dou valor à minha rotina e meu cotidiano. Escrevi no instagram, quando retornei da minha viagem de férias: “Se o poeta Mário Quintana disse que viajar é trocar a roupa da alma, então estar de volta ao lar é como reencarnar, estar envolto na própria pele, no aconchego e segurança dos nossos órgãos, mesmo que provisórios!”. Só não podemos nos acostumar ao eterno retorno do mesmo, nos acomodar.
Se não puder viajar nas minhas férias por circunstâncias financeiras ou pessoais, ou se preferir ficar em casa, tudo bem. Há outras maneiras de viver o eterno retorno da diferença. Livros, filmes e obras de arte são boas maneiras de viajar sem precisar sair do lugar. É possível mergulhar em novas histórias, personagens, biografias, obras, músicas... o importante é aguçar os sentidos, abrir-se às sensibilidades! Eu viajo jogada no sofá da na minha sala ouvindo Chico Buarque e bebendo uma taça de vinho, sozinha ou acompanhada. Eu viajo deitada na minha cama assistindo DVD. Eu viajo em qualquer lugar lendo meus livros e viajo imersa nos meus pensamentos, sonhos, fantasias... O sociólogo italiano Domenico De Masi criou o conceito de ócio criativo por isso: É preciso tempo para criar, sonhar, viajar, coisa que não temos no nosso cotidiano.
Eu sou uma pessoa que precisa de encantamentos para viver. Adoro me encantar com a florada dos ipês, com o canto dos pássaros, com uma criança brincando numa praça, com uma prosa boa no meio da tarde, um café coado na hora. Curto muito a natureza, o mar, as cachoeiras, a mata, os bichos, curto as pessoas, as cidades históricas, o campo, as diferentes culturas, tradições, culinárias e as histórias orais. Por isso, gosto do tempo das férias, sem compromissos! Desligar o celular, desconectar das tecnologias e conectar comigo mesma e com o universo ao meu redor. Andar a pé, fazer caminhos diferentes, novos trajetos, sem querer chegar rápido ou ficar presa no trânsito.
Com isso volto ao trabalho com mais energia, mais vigor, mais ideias novas. Recarregada. Faz parte do nosso “modus operandi” para produzir e consumir. Mas hoje eu quero um post leve... sem críticas, só devaneios. Afinal, nessas férias não perdi tempo nem arrumando armários, limpando casa, organizando papeis (coisas que também adiamos na correria do dia a dia). Quis faxinar minha alma, rever amigos, curtir meus filhos e dar boas risadas. Até dos estudos, que amo, eu me afastei! Mas agora estou de volta com minhas reflexões para compartilhar com vocês!
A demora para escrever um novo texto tem uma justificativa: as férias!! Vivemos uma época em que trabalhamos muito e nosso tempo é cada vez mais escasso. Por isto, nossas férias são sagradas, ou deveriam ser... pra mim, férias é época de descansar a mente, relaxar, deixar de lado as preocupações do dia a dia e se possível: viajar!

É revigorante conhecer lugares novos, pessoas diferentes, respirar novos ares. Nossos olhos estão acostumados com as mesmas paisagens, nossa convivência diária limita-se a círculo permanente de pessoas, assim nos habituamos aos mesmos assuntos, mesmas comidas, às mesmices. Não estou desvalorizando as nossas vidas, eu mesma dou valor à minha rotina e meu cotidiano. Escrevi no instagram, quando retornei da minha viagem de férias: “Se o poeta Mário Quintana disse que viajar é trocar a roupa da alma, então estar de volta ao lar é como reencarnar, estar envolto na própria pele, no aconchego e segurança dos nossos órgãos, mesmo que provisórios!”. Só não podemos nos acostumar ao eterno retorno do mesmo, nos acomodar.

Se não puder viajar nas minhas férias por circunstâncias financeiras ou pessoais, ou se preferir ficar em casa, tudo bem. Há outras maneiras de viver o eterno retorno da diferença. Livros, filmes e obras de arte são boas maneiras de viajar sem precisar sair do lugar. É possível mergulhar em novas histórias, personagens, biografias, obras, músicas... o importante é aguçar os sentidos, abrir-se às sensibilidades! Eu viajo jogada no sofá da na minha sala ouvindo Chico Buarque e bebendo uma taça de vinho, sozinha ou acompanhada. Eu viajo deitada na minha cama assistindo DVD. Eu viajo em qualquer lugar lendo meus livros e viajo imersa nos meus pensamentos, sonhos, fantasias... O sociólogo italiano Domenico De Masi criou o conceito de ócio criativo por isso: É preciso tempo para criar, sonhar, viajar, coisa que não temos no nosso cotidiano.

Eu sou uma pessoa que precisa de encantamentos para viver. Adoro me encantar com a florada dos ipês, com o canto dos pássaros, com uma criança brincando numa praça, com uma prosa boa no meio da tarde, um café coado na hora. Curto muito a natureza, o mar, as cachoeiras, a mata, os bichos, curto as pessoas, as cidades históricas, o campo, as diferentes culturas, tradições, culinárias e as histórias orais. Por isso, gosto do tempo das férias, sem compromissos! Desligar o celular, desconectar das tecnologias e conectar comigo mesma e com o universo ao meu redor. Andar a pé, fazer caminhos diferentes, novos trajetos, sem querer chegar rápido ou ficar presa no trânsito.

Com isso volto ao trabalho com mais energia, mais vigor, mais ideias novas. Recarregada. Faz parte do nosso “modus operandi” para produzir e consumir. Mas hoje eu quero um post leve... sem críticas, só devaneios. Afinal, nessas férias não perdi tempo nem arrumando armários, limpando casa, organizando papeis (coisas que também adiamos na correria do dia a dia). Quis faxinar minha alma, rever amigos, curtir meus filhos e dar boas risadas. Até dos estudos, que amo, eu me afastei! Mas agora estou de volta com minhas reflexões para compartilhar com vocês!
Patrícia Machado Domingues
Jornal: A Tribuna/Jaboticabal

sexta-feira, 19 de julho de 2013


"Espalhe que o amor não é banal.
E que, embora estejam distorcendo o sentido verdadeiro dele
nos tempos modernos de hoje, ele existe e é o ingrediente
mais importante da vida, a própria porção mágica da Felicidade".

Mario Quintana

sábado, 29 de junho de 2013

Desdobramentos


O homem quando jovem, é só, apesar de suas múltiplas experiências. Ele pretende, nessa época, conformar a realidade com suas mãos, servindo-se dela, pois acredita que, ganhando o mundo, conseguirá ganhar-se a si próprio.
Acontece, entretanto, que nascemos para o encontro com o outro, e não o seu domínio. Encontrá-lo é perdê-lo, é contemplá-lo na sua libérrima existência, é respeitá-lo e amá-lo na sua total e gratuita inutilidade.
O começo da sabedoria consiste em perceber que temos e teremos as mãos vazias, na medida em que tenhamos ganho ou pretendamos ganhar o mundo. Neste momento, a solidão nos atravessa como um dardo. É meio-dia em nossa vida e a face do outro nos contempla como um enigma. Feliz daquele que, ao meio-dia, se percebe em plena treva, pobre e nu. Este é o preço do encontro, do possível encontro com o outro. A construção de tal possibilidade passa a ser, desde então, o trabalho do homem que merece o seu nome.”



Hélio Peregrino
(introdução do livro “O Encontro Marcado” de Fernando Sabino)

sábado, 22 de junho de 2013

Opinião: Nós estamos vivendo o resultado de uma série de paradoxos

HELIO DE LA PEÑA
Especial para a Folha De São Paulo/22 de junho de 2013

 
Não se fala em outra coisa, não se escreve sobre outra coisa. Nunca tantos falaram tanto sem saber o que estão dizendo. Quem afirma algo com convicção hoje é obrigado a desdizer tudo amanhã.
Temos que tomar cuidado com as certezas absolutas. É preciso entender a mensagem das ruas e ninguém sabe onde fica a tecla SAP.
Se tivesse que arriscar uma síntese para o que está rolando, diria "chega de caô!". Estamos vivendo o resultado de uma série de paradoxos.
A coisa é tão complexa que temos que agradecer aos prefeitos por não terem baixado as tarifas de ônibus logo de cara e à truculência da
polícia nos protestos.
Sem essa ajuda, talvez não tivéssemos chegado a esse ponto em que tudo está sendo posto em cheque. Por R$ 0,20, muitos bilhões desviados estão sendo denunciados. Escândalos estão sendo desmascarados pela máscara inspirada em Guy Fawkes, um inglês do século XVII.
Fazia tempo que os estudantes não saíam às ruas. A primeira vez que participei de um movimento desse tipo foi em 1977, quando foi ressuscitado o movimento estudantil.
Queríamos reviver a Passeata dos Cem Mil de 1968. A atmosfera foi parecida, respirávamos democracia no fim da ditadura. Depois voltei às ruas pela anistia, pelas Diretas Já, pelo impeachment do Collor, entre outras vezes menos marcantes.
Participei ativamente do movimento estudantil. Embarquei nesse ambiente político universitário cheio de esperança. Mas testemunhei muita sujeira.
Os estudantes sendo iludidos por raposas velhas de partidos de esquerda que faziam uma mímica de democracia, enquanto decidiam tudo em conchavos na calada da noite.
Era do Partidão e vi bem como era isso. As lideranças se orgulhavam de conduzir a massa pra onde ela não sabia que queria ir, era o que se dizia. Lembro do caso de uma mãe procurando pelo filho na PUC do Rio. Ao encontrar um grupo de estudantes, perguntou: "Vocês conhecem o fulano? Ele é o líder de vocês...".
Até então acreditávamos no estereótipo do bem e do mal. O bem era a esquerda, o mal, a direita. A esquerda podia fazer cagadas, manipular opiniões, até desviar verbas pela causa. "Os fins justificam os meios", diziam as lideranças progressistas.
Conseguimos, enfim, derrubar a direita e colocar a esquerda no poder. E o que se viu? A maior sequência de escândalos e corrupção da nossa história.
Mentiras se repetindo, inimigos chegando a acordos, direita e esquerda fazendo de tudo para se perpetuarem no poder. Lula, Collor, Sarney, Dilma, Maluf, todos na mesma mesa de jantar.
Os absurdos são anteriores à era PT, mas foram se acumulando e continuam. Marco Feliciano na Comissão de Direitos Humanos, Renan na presidência do Senado, Genuíno, condenado, eleito e legislando sobre a ação do Judiciário, estádios bilionários construídos em cidades sem time na primeira divisão, estatísticas maquiando nossa realidade... Até que, por R$ 0,20, tudo vem à tona.
Ninguém sabe onde isso vai dar. Não se sabe como fazer pra mudar a situação. Este "foda-se" que sempre deram pra nós agora estamos devolvendo pra eles.
Vandalismo não é solução, nem violência policial. Qual o próximo passo? A vontade é tirar todos de todos os cargos. Mas, em algum momento, alguém terá que representar essa nova mentalidade.
O voto é nossa arma mais poderosa. Não vamos conseguir botar 170 milhões de pessoas no Palácio do Planalto. E aí vamos ter que confiar que a sinceridade é possível, que as intenções serão de fato as melhores.
Talvez não seja agora. Não sabemos como nem quando. Queremos acreditar que um dia vai ser. Por ora,resgatemos a utopia. Já é um grande passo.
Helio de la Peña, 54, é humorista do Casseta & Planeta, ator e roteirista da TV Globo.

segunda-feira, 17 de junho de 2013


Saudade

Saudade é solidão acompanhada,
é quando o amor ainda não foi embora,
mas o amado já...

Saudade é amar um passado que ainda não passou,
é recusar um presente que nos machuca,
é não ver o futuro que nos convida...

Saudade é sentir que existe o que não existe mais...

Saudade é o inferno dos que perderam,
é a dor dos que ficaram para trás,
é o gosto de morte na boca dos que continuam...

Só uma pessoa no mundo deseja sentir saudade:
aquela que nunca amou.

E esse é o maior dos sofrimentos:
não ter por quem sentir saudades,
passar pela vida e não viver.

O maior dos sofrimentos é nunca ter sofrido.


Pablo Neruda

domingo, 9 de junho de 2013

LEE SIEGEL, - O Estado de S.Paulo/09/06/2013
 
A FACE OCULTA DO NOVO

 
notícia causou frisson na minha cidade suburbana ao lado de Nova York. Um rapaz de 17 anos, a poucas semanas de concluir o ensino secundário, parou diante de um trem de subúrbio em movimento, Teve morte instantânea.
 
Como sempre ocorre quando se noticia um suicídio, a questão de por que ele o fez torturou familiares e amigos do jovem. Atormentou estranhos, também, porque o suicídio é o mais íntimo dos tipos de violência. Ele nos faz perguntar não somente por que determinada pessoa o cometeu, mas por que alguém o faria, confrontando-nos assim com o aspecto mais despojado da existência. Mas desta vez a tentativa de entender o mistério por trás de um suicídio cobriu-se de especial urgência. É que, segundo estudo divulgado algumas semanas atrás, o número de americanos que estão se matando atingiu um nível sem precedentes.
No período de 1999 a 2010, o suicídio de americanos entre 35 e 64 anos de idade cresceu quase 30%. Mais pessoas nos Estados Unidos morrem hoje pelas próprias mãos do que em acidentes de carro. Entre homens na faixa dos 50 anos, a taxa de suicídio cresceu 50%.
Os intelectuais imediatamente se lançaram à tarefa de tentar entender a nova e assustadora estatística. Quando tiverem terminado, o crescimento da "autochacina" nos Estados Unidos terá sido eclipsado por confortadoras explicações racionais:
há mais pessoas solitárias do que nunca; há mais gente armada que nunca; pessoas em áreas rurais são mais propensas a se matar do que em lugares mais densamente povoados; os chamados baby-boomers - pessoas nascidas durante a onda de prosperidade do pós-2ª Guerra entre 1946 e 1964 - têm expectativas impossivelmente altas que simplesmente não podem se realizar no mundo real.
Todos esses fatores são difíceis de provar, e têm importância apenas limitada.
As verdadeiras razões por que o suicídio está em ascensão, em especial entre homens na faixa dos 50, são desconcertantes demais para serem abordadas diretamente. Isso porque são o lado escuro de tendências que estão sendo constantemente comemoradas.
Comecemos pela desintegração familiar. De cada canto da sociedade comercial, ser solteiro é projetado como a existência ideal. O mercado prefere os consumidores apressados, propensos a gastar, a membros de famílias que tendem a poupar para o futuro. E gratificar os sentidos, todos os sentidos, é bem mais fácil quando não se está comprometido com outra pessoa.
Depois, há a internet, a invenção social mais impactante desde o automóvel. A web é direcionada para o indivíduo solitário, não para a família, ou mesmo o casal. As pessoas se conectam na rede por várias razões, é claro, algumas de cunho prático ou mundano, mas quem se conecta quase sempre o faz sozinho, para satisfazer um ou outro impulso. Nesse contexto, não é a solidão que pode levar alguém ao suicídio. É o fato de que ficar solitário se tornou uma condição tão normal que está ficando cada vez mais difícil estar com outras pessoas. Os desafios e complicações decorrentes de se estar envolvido com outros estão se tornando insuportáveis para psiques acostumadas à existência solitária, vivida diante de suas telas.
Isso não significa que o capitalismo americano, incansavelmente inventivo, seja culpado do crescimento da taxa de suicídios ou algo assim. Países socialistas como os do norte da Europa têm taxas de suicídio notoriamente altas. As pessoas nessas sociedades com frequência têm tantas coisas de suas vidas decididas e administradas em seu favor que sua força de vontade se atrofia e um tédio mortal se instala. Mas o consumismo insanamente acelerado nos Estados Unidos, que de maneiras sutis e explícitas faz do celibato uma condição heroica, isola o indivíduo quando torna mais difícil para ele ou ela lidar com outros indivíduos.
Além das décadas de desintegração familiar, as décadas de erosão de simplesmente todo tipo de autoridade também separaram as pessoas das estruturas sociais que antes as sustentavam em tempos de dificuldade emocional. Tanto na cultura popular como na intelectual elevada, o padre, o ministro, o médico, o policial, o estadista foram todos expostos como fraudes ocultando a luxúria e a ganância por trás da fachada de autoridade enquanto abusavam cruelmente de seu poder.
 Algumas maçãs podres estragaram toda uma colheita da humanidade. Antigamente, uma pessoa angustiada podia recorrer a uma figura consoladora cuja competência fora sancionada pela sociedade. Agora, quando os salva-vidas sociais são todos acusados de não saber nadar, a sensação de não ter a quem recorrer ficou ainda mais aguda.
O preço proibitivo da assistência médica também joga com certeza um papel. Não poder pagar um profissional da saúde tem um efeito extremamente danoso em pessoas deprimidas propensas ao suicídio. Elas nem sequer conseguem obter uma receita de antidepressivo porque, ou não podem pagar a consulta de um médico que o receitaria, ou não podem pagar o próprio remédio.
Mas como a maioria dos suicídios parece ser de homens na faixa dos 50 anos, a principal razão do seu desespero é a rápida obsolescência de seu tipo social. A obsessão americana pela juventude tornou esses homens invisíveis. A rápida sucessão das novas ondas de tecnologias os fez sentir que já não se enquadram em seu ambiente. As mazelas econômicas dos últimos anos os privaram do emprego e da autoestima. E a intensificação da historicamente atrasada ascensão das mulheres - boa, positiva e necessária - tomou-lhes mais um pouco de terreno.
É difícil falar de todos esses desdobramentos como fatores por trás do aumento da incidência de suicídios porque tais fatores - cultura jovem, tecnologia, a mudança para uma economia de informação, a capacitação (de um certo grupo) de mulheres - são tendências de ponta das quais os Estados Unidos se orgulham. E quando as estatísticas de uma sociedade contradizem sua autoimagem, torna-se uma tarefa urgente dessa sociedade manter seu estado de espírito feliz justificando e esquecendo as estatísticas. / TRADUÇÃO DE CELSO PACIORNIK



 

quarta-feira, 5 de junho de 2013


Quando eu era jovem, a

corrente que me arrastava corria forte e

rápida. A brisa da primavera derrotava-se

a si mesma, as árvores ardiam em flores e

os pássaros não dormiam, cantando sem

parar.


Naveguei vertiginosamente,

Arrebatado pelo dilúvio da paixão. Eu não

tinha tempo para ver, sentir ou deixar que

o mundo entrasse em meu ser.


Agora que a maré da juventude

Baixou e eu restei na praia, posso ouvir a

Profunda música de todas as coisas, e o céu

abre para mim o seu coração cheio de estrelas.

(Tagore, 1991,p.38)

sexta-feira, 31 de maio de 2013

Consolo Na Praia

Carlos Drummond de Andrade

 
 
A infância está perdida.
A mocidade está perdida.
Mas a vida não se perdeu.
O primeiro amor passou.
O segundo amor passou.
O terceiro amor passou.
Mas o coração continua.
Perdeste o melhor amigo.
Não tentaste qualquer viagem.
Não possuis carro, navio, terra.
Mas tens um cão.
Algumas palavras duras,
em voz mansa, te golpearam.
Nunca, nunca cicatrizam.
Mas, e o humor?
A injustiça não se resolve.
À sombra do mundo errado
murmuraste um protesto tímido.
Mas virão outros.
Tudo somado, devias
precipitar-te, de vez, nas águas.
Estás nu na areia, no vento...
Dorme, meu filho.
 
..."A ideia da perda é um dos polos básicos da construção poética, referindo-se a etapas da existência considerada míticas na tradição literária romântica ocidental: a infância e a juventude. O que está sendo perdido é o tempo idílico da inocência e da ingenuidade: é a fantasia de um mundo durável e claramente organizado.
Além de continuidade do substrato orgânico, há também a ideia de vida, como força, ânimo e entusismo para resistir e sobreviver ao naufrágio de certas ilusões".
Livro: Solidão-Solitude
Passagens Femininas do Estado Civil ao Terítório da Alma de Luci Helena Baraldo Mansur. Editora Edusp
 



segunda-feira, 27 de maio de 2013

 
 
Há pessoas que nos fazem voar. A gente se encontra com elas e leva um bruta susto (…) elas nos surpreendem e nos descobrimos mais selvagens, mais bonitos, mais leves, com uma vontade incrível de subir até as alturas, saltando de penhascos. Outras, ao contrário, nos fazem pesados e graves. Pés fincados no chão, sem leveza, incapazes de passos de dança. Quanto mais a gente convive com elas mais pesados ficamos.

quinta-feira, 2 de maio de 2013


MEGAFONES
Denise Fraga

"Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas."
 
Acho que muitas namoradas não conseguiram terminar seus falidos namoros adolescentes por culpa da famosa e melosa frase de Saint-Exupéry. Se o namorado fosse loiro como o Pequeno Príncipe, então, era quase impossível. Lá vinham os campos de trigo se misturando aos cabelos do rapaz e o rompimento ficava de novo para o sábado seguinte.
 
Fui uma delas. E, quando finalmente consegui dar adeus ao meu namoradinho cansado, ele deixou a frase grudada por fora no vidro da janela do meu quarto para que eu nunca mais pudesse olhar o horizonte sem a culpa necessária pelo que eu estaria deixando para trás.
Alguns anos de análise cuidaram disso. Esqueci a frase, perdoei Saint-Exupéry e devo ter acumulado, como qualquer um de nós, uma lista de pessoas cativadas abandonadas por minha responsabilidade.
Mas, dia desses, o Pequeno Príncipe apareceu em minha cabeça num curioso embate com Carlinhos Brown e Marisa Monte. "Eu sou de ninguém, eu sou de todo mundo e todo mundo me quer bem..."
 
Assim, isolados, os versos da canção dos Tribalistas me pareceram a trilha perfeita para as redes sociais. Nós nos livramos do peso da frase do Pequeno Príncipe ao seu cativante aviador, mas, mesmo se assim desejássemos, não daríamos mais conta de nutrir tantos seres cativados por nossos posts, tuitadas e cliques. Nossa responsabilidade pelo que cativamos já pode até ser medida em número de "curtidas", mas o retorno personalizado ao curtidor fica cada vez mais raro.
 
Viramos todos oradores em praça pública.
 
 Outro dia, ouvi numa conversa: "Não dá mais pra falar para uma pessoa só. É perda de tempo". E foi aí que a frase adolescente ressurgiu para mim cheia de sentido e desprovida de todo o açúcar.
Nós nos tornamos responsáveis pelo que cativamos porque é no outro que nos reconhecemos. Como que refletidos em espelhos variados, garantimos a certeza da nossa existência a partir de onde reverberamos. É a partir do outro que tomamos posse de quem somos. Do outro. E não dos outros. Um de cada vez montando o rico mosaico que compõe nossa personalidade.
 
Porque não existe Fulano. Existe o Fulano que se lê nos olhos de quem o recebe. Dois olhos e não milhares. Porque senão não é pessoa, é persona. Uma imagem de si que se irradia sem se alterar pela convivência, pelo recebimento, pela relação com o alheio. Um Fulano a partir de si, que mal se reconhece, mesmo com um bilhão de curtidas.

 
Denise Fraga é atriz e autora de "Travessuras de Mãe" (ed. Globo) e  Globo). Escreve a cada duas semanas na versão impressa do caderno "Equilíbrio".
fonte: "http://www1.folha.uol.com.br/colunas/denisefraga/1270511
 

sexta-feira, 5 de abril de 2013

A harmonia oculta
é superior à aparente.


A oposição traz concórdia.
Da discordia
nasce a mais bela harmonia.
 
É na mudança
que as coisas encontram repouso.

As pessoas não compreendem
como o divergente
consigo mesmo concorda.
 Há uma harmonia de tensões contrárias
assim como a do arco e da lira.
o nome do arco é vida
Mas sua função é a morte.
(Heráclito)
 



segunda-feira, 1 de abril de 2013

 
 
Viajando num carro confortável
 
Viajando num carro confortável
Por uma estrada chuvosa do interior
Avistamos ao cair da noite um homem rústico
Solicitando-nos condução com um gesto humilde.
Tínhamos teto e tínhamos espaço e seguimos em frente
E ouvimos a mim dizer num tom de voz árido:"Não,
Não podemos levar ninguém conosco".
Tínhamos avançado já boa distância, um dia de viagem talvez
Com este comportamento meu
E todo este mundo.
Bertold Brecht

quarta-feira, 27 de março de 2013

Definição

O corpo é onde
é carne:

o corpo é onde
há carne
e o sangue
é alarme.

O corpo é onde
é chama:

o corpo é onde
há chama
e a brasa
inflama
.

O corpo é onde
é luta:

o corpo é onde
há luta
e o sangue
exulta.

O corpo é onde
é cal:

o corpo é onde
há cal
e a dor
é sal.

O corpo
é onde
e a vida
é quando.


Publicado no livro Canto e palavra (1965).
Affonso Romano de Sant'Anna

quinta-feira, 21 de março de 2013

 
 
Francisco

Marca, design, conduta, relações públicas, alinhamento interno: "habemus papam"

Que coisa mágica é a vida. Estava eu chegando a Buenos Aires na semana passada para uma reunião de trabalho e jamais poderia imaginar que estivesse ali naquele dia para presenciar a mão do Espírito Santo e da história.

Saí do Aeroparque, o belo aeroporto ribeirinho da capital argentina, e fui até o meu hotel trocar de roupa antes de minha reunião. Liguei a televisão e, para a minha surpresa, o papa já havia sido escolhido.

Durante a próxima hora, eu e o mundo esperamos para ver que novo papa a fumaça branca nos traria. E eis que ele chegou. Surpreendente como a vida. Um argentino. E eu em Buenos Aires.

Começava ali uma aula de comunicação para o mundo que resume e mostra de maneira instintiva tudo o que os teóricos enchem a paciência e perdem um tempo enorme para explicar: a comunicação de 360 graus.

O cardeal Jorge Mario Bergoglio mostrou sem PowerPoint nem lero-lero como uma palavra pode mudar tudo, como um nome pode ser capaz de transmitir para o mundo todo uma mensagem tão poderosa e precisa.

A palavra é Francisco.

Francisco é uma palavra rica de significados num mundo pobre de significado.

Francisco quer dizer coma moderadamente num mundo obeso. Francisco quer dizer beba com alegria num mundo que enfia a cara no poste. Francisco quer dizer consumo responsável em sociedades de governos e consumidores endividados. Francisco quer dizer o uso responsável do irmão ar, do irmão mar, do irmão vento e de todas as riquezas debaixo do irmão Sol e da irmã Lua.

Francisco é um freio de arrumação não só na Igreja Católica Apostólica Romana, mas na sociedade a quem ela deve guiar. Em 24 horas, Bergoglio pegou uma instituição que estava emparedada e a tirou da parede, transportou-a dos intramuros do Vaticano para o meio da rua, para o meio do rebanho.

Comunicar é o papel da igreja. Para isso, foram escritos o Velho Testamento e o Novo Testamento, e Jesus não deixa dúvida quando disse aos apóstolos: "Ide e anunciai o Evangelho".

Ide, ao contrário do que faz a gorda Cúria Romana, quer dizer ir, não quer dizer ficar em Roma. Quer dizer ir e anunciar.

E anunciar hoje é muito mais do que o comercial de 30 segundos. Anunciar hoje é usar todas as ferramentas disponíveis, todos os pontos de contato com seu público. Papa Francisco sabe disso muito bem.

Tanto sabe que muito antes de se apresentar ao mundo na sacada do Vaticano baixou um Steve Jobs nele, e, quando o monsenhor veio lhe oferecer uma veste toda rebuscada, Francisco Jobs retrucou: Se o senhor quiser, pode vesti-la, monsenhor, eu, não. O carnaval acabou.

É digno de reparo que Francisco não fez pesquisas nem testes antes de criar tudo isso. Não precisava. Foi buscar sua mensagem no DNA da igreja. E está escrevendo certo por linhas tortas.

Mesmo as coisas conservadoras que têm dito, coisas com as quais eu pessoalmente não concordo, são muito relevantes. A igreja não pode querer agradar a todo mundo. Ela tem que marcar territórios e significar coisas, e, ao fazê-lo, naturalmente exclui almas de seu rebanho.

Marca, design, conduta, relações públicas, endomarketing, alinhamento interno: "habemus papa".

Francisco se utilizou de todos os recursos do marketing para passar sua mensagem rapidamente, com alto impacto e precisão, para o público interno e para o público externo.

Parece até que o 3G Capital assumiu o comando da igreja. Choque de gestão, orçamento base zero, alinhamento com a cultura perdida, volta às raízes, fé no trabalho, administração franciscana e disciplina de jesuíta de santo Inácio e professor Falconi.

Paradoxalmente, Francisco hoje acredita numa gestão mais parecida com Lutero do que com a tradição romana. Mas a igreja só teve que se enfrentar com Lutero porque ao longo do tempo se esqueceu da palavra Francisco.

NIZAN GUANAES, publicitário e presidente do Grupo ABC.

quarta-feira, 20 de março de 2013

CANÇÃO DE OUTONO


Perdoa-me, folha seca,
não posso cuidar de ti.
Vim para amar neste mundo,
e até do amor me perdi.

De que serviu tecer flores
pelas areias do chão,
se havia gente dormindo
sobre o própro coração?

E não pude levantá-la!
Choro pelo que não fiz.
E pela minha fraqueza
é que sou triste e infeliz.
Perdoa-me, folha seca!
Meus olhos sem força estão
velando e rogando áqueles
que não se levantarão...

Tu és a folha de outono
voante pelo jardim.
Deixo-te a minha saudade
- a melhor parte de mim.
Certa de que tudo é vão.
Que tudo é menos que o vento,
menos que as folhas do chão...
Cecília Meireles

segunda-feira, 18 de março de 2013



Igreja de Santa Sabina , em Roma
imagem do site:www.ecclesia.com.br/...
Veja a nave retangular, flanqueada aos lados por duas filas de colunas e fechada ao fundo por uma abside que acolhe o altar-mor. Se você conhecer a linguagem arquitetônica, refletirá profundamente sobre tudo isso e captará o "âmbito espiritual" que os primeiros cristãos quiseram instaurar.É um âmbito de união de um grupo de peregrinos que caminha para a pátria verdadeira.
...Quando lhes foi permitido edificar templos, os cristãos de Roma olharam ao seu redor a fim de se inspirar. O templo romano por excelência- o Panteão- possui uma planta circular e uma cúpula esférica. O círculo e a esfera são figuras "perfeitas" para os antigos, mas convidam ao estatismo, porque a partir do centro domina-se perfeitamente todo o espaço. Nada convida a percorrê-lo.Essa atitude estática corresponde muito bem à concepção romana de vida, mas se opõe ao espírito de peregrinos que caracteriza os cristãos, para quem essa  vida não é senão um prelúdio da vida verdadeira. Os primeiros cristãos rejeitaram o modelo do Panteão e tomaram a dos salões nobres denominados "basílicas". Sua forma retangular, com duas absides nos lados mais curtos e duas filas de colunas de mármore ao redor, suscitava também uma atitude estática. Para passar dessa atitude a uma que fosse dinâmica, os cristãos suprimiram uma das absides e abriram nela a porta de entrada. Eliminaram as séries de colunas correspondentes aos lados curtos e fecharam as laterais. O altar, eles o situaram diante da abside restante. E dessa forma conseguiram criar uma linha diretriz horizontal que dirige o olhar do cristão para o altar, que é o ponto de confluência comum.
Alfonso López Quintás- Inteligência criativa/descoberta pessoal de valores

quinta-feira, 14 de março de 2013

 
 
"Para chegar ao outro lado, é preciso abandonar o barco seguro dos hábitos e seguranças anteriores e andar sobre a água,como Pedro. Isso só funciona enquanto Pedro está orientado para Cristo. No momento em que percebe a ventania e as ondas, ele afunda".
Andreas Ebert

segunda-feira, 11 de março de 2013

"Onde não se admite a tristeza, ela bloqueia o fluxo da vida, e surge a depressão.Muitas vezes ela é encoberta com comprimidos ou extravasada com álcool. Assim não é possível deter o círculo vicioso. A tristeza precisa de um "container"uma pessoa ou um grupo onde possa existir e tenha lugar". Andreas Ebert

segunda-feira, 4 de março de 2013

Poder, dinheiro e sexo
Folha de São Paulo/04/03/ 2013
 
imagem da internet
 
"Meu Deus, eu queria tanto ouvir um pecado novo." Esta frase me foi dita por uma amiga minha, uma verdadeira dama, citando um padre amigo seu.
Esta fala revela a repetição dos temas humanos: dinheiro, poder, sexo. Nada há de novo embaixo do sol, como diz a Bíblia Hebraica. Iniciantes acham que há.
Posso imaginar a monotonia do confessionário. Para nós, mero mortais, a ideia, por exemplo, de uma mulher contando suas infidelidades, reais ou imaginárias, é uma delícia de luxúria. Para o apreciador do sexo frágil, o segredo do mundo está entre as pernas das mulheres.
Aliás, a luxúria é um dos sete pecados capitais. E pecado é coisa séria, apesar de hoje estar na moda achar que não existem mais pecados. Eu, que sou um medieval, creio mais neles do que nas ciências humanas.
Ingênuos acreditam que a vida mudou em sua "essência". Mesmo o caso do Vatileaks repete a velha história de poder, dinheiro e sexo.
Mesmo Jesus, em seus 40 dias no deserto (que por sua vez simbolizam os 40 anos do povo hebreu perdido no Sinai, pós-Egito), foi tentado nesta velha chave: poder, ouro, mulheres.
Mas existe uma hierarquia nesta estrutura. Por exemplo, ninguém nunca perdeu mulher perseguindo dinheiro (ouro), mas sim perdeu muito dinheiro perseguindo mulher, portanto, dinheiro é mais essencial e seguro do que começar por mulheres. Uma vez tendo o dinheiro, elas virão.
"Sabedorias" como essa falam do pecado, essa marca de nossa natureza humana.
Prever o comportamento humano a partir do pecado é quase uma ciência exata.
Uma coisa chata sobre essa ciência exata do pecado é justamente ela furar nossas utopias.
E o mundo moderno, assim como é o tempo da técnica e da ciência, é também o tempo da mentira moral generalizada que se diz utopia.
Adianto que não uso pecado aqui como algo necessariamente religioso, mas sim como traço de comportamento verificável do tipo "ratinho do Pavlov": os sete pecados capitais funcionam "cientificamente" melhor do que a luta de classes.
Lembre, por exemplo, da inveja que seu colega de trabalho tem quando você tem mais sucesso do que ele.
E se ele não reagir de modo banal, isto é, babar de inveja, saiba que você está diante de alguém de caráter. Coisa rara.
As feias querem matar suas colegas mais bonitas. A única esperança das feias é que as bonitas sejam mesmo burras e superficiais.
Mas a luxúria é top. Depois da revolução sexual pensamos que a luxúria não existe mais e que "sexo salva". Pensar isso é coisa de iniciante.
O que caracteriza o pecado é que ele extenua a pessoa. A ideia mais perto disso é a ideia de vício. Vício em drogas, álcool. Luxúria seria o vício no sexo.
Alguns especialistas acham que não existe vício em sexo e que falar disso é simplesmente ser "moralista" ou ter inveja de quem faz muito sexo.
Eu suspeito de que quem acha que não existe vício em sexo é que não faz sexo o suficiente, por isso não sabe o que é estar submetido a um desejo que destrói a alma.
Neste caso, a simples visão de uma mulher, suas pernas, sua voz, seus gestos, implica no silêncio do resto do mundo.
Os antigos e medievais entendiam mais da natureza humana do que nós, principalmente porque eram menos utópicos e não sofriam dessa bobagem de achar que é a "ideologia" que determina quem somos.
A "crítica da ideologia" é uma das pragas contemporâneas e virou uma espécie de fetiche do pensamento, que nos impede de ver o óbvio: poder e dinheiro trazem sexo, seja homem ou mulher, isso não é "ideológico".
Quase todo mundo faz quase o tempo todo quase tudo por poder, dinheiro e sexo.
Sobre o risco de conceitos virarem fetiche, o livro de Luís de Gusmão, "O Fetichismo do Conceito" (Topbooks), é uma pérola. Recomendo para quem acredita em "mitos".
Autores como Evagrio Pônticos (345-399), Santo Agostinho (354-430) e São Tomás de Aquino (1225-1274) podem nos ensinar bastante sobre natureza humana.
Saia da moda e leia os antigos e os medievais. Para eles, o pecado é a perda da autonomia da vontade. Quem nunca viveu isso, que se cale e vá brincar.
 
Luiz Felipe Pondé, pernambucano, filósofo, escritor e ensaísta, doutor pela USP, pós-doutorado em epistemologia pela Universidade de Tel Aviv, professor da PUC-SP e da Faap, discute temas como comportamento contemporâneo, religião, niilismo, ciência. Autor de vários títulos, entre eles, "Contra um mundo melhor" (Ed. LeYa). Escreve às segundas na versão impressa de "Ilustrada".

Apontadora de Idéias

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"A senhora me desculpe, mas no momento não tenho muita certeza. Quer dizer, eu sei quem eu era quando acordei hoje de manhã, mas já mudei uma porção de vezes desde que isso aconteceu. (...) Receio que não possa me explicar, Dona Lagarta, porque é justamente aí que está o problema. Posso explicar uma porção de coisas... Mas não posso explicar a mim mesma." (Lewis Carroll)

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