domingo, 14 de junho de 2009

O IMPULSO
Sou o que se chama de pessoa impulsiva.Como descrever? Acho que assim: vem-me uma ideia ou um sentimento e eu, em vez de refletir sobre o que me veio,ajo quase que imediatamente.O resultado tem sido meio a meio:às vezes acontece que agi sob uma intuição dessas que não falham,às vezes erro completamente, o que prova que não se tratava de intuição,mas de simples infantilidade. Trata-se de saber se devo proseguir nos meus impulsos. E até que ponto posso controlá-los. Há um perigo:se reflito demais deixo de agir.E muitas vezes prova-se depois que eu deveria ter agido.Estou num impasse.Quero melhorar e não sei como.Sob o impacto de um impulso, já fiz bem a algumas pessoas.E,ás vezes, ter sido impulsiva me machuca muito.E mais: nem sempre meus impulsos são de boa origem.Vêm, por exemplo, da cólera.Essa cólera às vezes deveria ser desprezada; outras,como me disse uma amiga a meu respeito, são cólera sagrada.às vezes minha bondade é fraqueza, às vezes ela é benéfica a alguém ou a mim mesma.Ás vezes restringir o impulso me anula e me deprime; às vezes restringi-lo dá-me uma sensação de força interna. Que farei então? Deverei continuar a acertar e a errar, aceitando os resultados resignadamente? Ou devo lutar e tornar-me uma pessoa mais adulta? E tambem tenho medo de tornar-me adulta demais: eu perderia um dos prazeres do que é um jogo infantil, do que tantas vezes é uma alegria pura.Vou pensar no assunto.E certamente o resultado ainda virá sob a forma de um impulso.Não sou madura bastante ainda.Ou nunca serei.
fonte: Clarice Lispector/Aprendendo a viver/editora Rocco
Que reflexão linda sobre "ser autêntico". Clarice foi capaz de escrever sobre a alma humana de um jeito profundo e ao ler sua obra confirmamos o que ela dizia: "Ser sangra".

Apontadora de Idéias

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"A senhora me desculpe, mas no momento não tenho muita certeza. Quer dizer, eu sei quem eu era quando acordei hoje de manhã, mas já mudei uma porção de vezes desde que isso aconteceu. (...) Receio que não possa me explicar, Dona Lagarta, porque é justamente aí que está o problema. Posso explicar uma porção de coisas... Mas não posso explicar a mim mesma." (Lewis Carroll)

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