quarta-feira, 17 de junho de 2009

Essa história, “o rei e omeleta” ou “omeleta de amoras”, pertence a Walter Benjamim.
“Era uma vez um rei que chamava a si os tesouros da Terra, mas apesar disso não se sentia feliz. Então, um dia, mandou chamar seu cozinheiro predileto e disse-lhe: “Por muito tempo tens trabalhado para mim com fidelidade e tens-me servido à mesa as mais esplêndidas iguarias.
Porém, desejo agora uma última prova do teu talento.
Deves fazer-me uma omoleta de amoras igual àquela que saboreei há 50 anos, em minha mais tenra infância.
Naquela época meu pai travava guerra contra seu perverso inimigo a oriente.
Este acabou vencendo, e tivemos de fugir.
E fugimos, pois, noite e dia, meu pai e eu, através de uma floresta escura, onde afinal acabamos por nos perder.
Aí morava uma velhinha que amigavelmente convidou-nos a descansar, tendo ela própria, porém, ido ocupar-se do fogão.
Não muito tempo depois estava à nossa frente a omeleta de amoras!
Mal tinha levado à boca o primeiro bocado, senti-me maravilhosamente consolado, e uma nova esperança entrou no meu coração.
Já era rei quando mais tarde mandei procurá-la, vasculhei todo o reino, não encontrei nem a velha nem qualquer outra pessoa que soubesse preparar a omeleta de amoras.
Agora, quero que atendas este meu último desejo: faz-me aquela mesma omeleta de amoras!
Se o cumprires, farei de ti meu genro e herdeiro de meu reino.
Mas, se não me contentares, deverás morrer”. Então o cozinheiro disse: “Majestade, podeis chamar logo o carrasco.
Conheço, é verdade, o segredo da omeleta de amoras e todos os seus ingredientes, desde o trivial agrião até o nobre tomilho.
Sei empregar todos os condimentos.
Sem dúvida, há também o verso mágico que se deve recitar ao bater os ovos, e sei que o batedor de madeira de buxo deve ser sempre girado num só sentido.
Contudo, ó rei, terei de morrer!
Minha omeleta não vos agradará ao paladar, jamais será igual àquela que vos veio pelas mãos da velhinha.
Faltará o perigo da batalha e o seu picante sabor, a proximidade do pai na floresta desorientada, a emoção e a vigilância do fugitivo perdido.
Não será omoleta comida com o sentido alerta do perseguido.
Não terá o descanso no abrigo estranho e o calor do fogo amigo, a doçura da inesperada hospitalidade de uma velha.
Não terá o sabor do presente incomum e do futuro incerto”.
Assim falou o cozinheiro.
O rei, porém, calou um momento e não muito depois consta haver dispensado dos serviços reais o cozinheiro, rico e carregado de presentes”.
Folha de São Paulo, Folhetim-22/01/84
O desejo humano , tal como entendido pela psicanálise, não é a mesma coisa que a necessidade.
O desejo é da ordem puramente psíquica, é como tal pertence a ordem do simbólico.
O desejo é a enunciação da falta e sendo singular produz a solidão.

Sua satisfação é sempre parcial e realiza-se no movimento do querer mais e mais.
Essa história nos diz que ninguem é capaz de satisfazer nossos desejos, e buscarmos incessantemente o Outro como aquele que vai nos trazer a completude e a felicidade tem como resultado a frustração.

Apontadora de Idéias

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"A senhora me desculpe, mas no momento não tenho muita certeza. Quer dizer, eu sei quem eu era quando acordei hoje de manhã, mas já mudei uma porção de vezes desde que isso aconteceu. (...) Receio que não possa me explicar, Dona Lagarta, porque é justamente aí que está o problema. Posso explicar uma porção de coisas... Mas não posso explicar a mim mesma." (Lewis Carroll)

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