quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Num tempo não tão distante assim,
viviam pessoas um tanto estranhas, de um modo um tanto estranho também.
Moravam em pequenas cidades e seus hábitos eram por demais diferentes dos nossos - seres modernos e sofisticados - que têm como diversão, após uma jornada de trabalho de dez ou doze horas, colocarem-se em frente à T.V. ou computador e distraírem-se até o sono chegar.
Sinceramente, não sei o que aquelas pessoas pensavam sobre a vida; o que sei é que os fatos relatados são a mais pura verdade, mas vou avisando: ”qualquer semelhança é mera coincidência”, afinal, não poderíamos ter parentesco algum com seres tão “ingênuos”.
Nas tardes mais quentes, por volta das dezoitos horas (imaginem!), já estavam em casa e, após o jantar em que comiam sem se preocupar com as calorias ingeridas, puxavam as cadeiras e sentavam-se nas calçadas. Às vezes, só a família, outras vezes, abriam a roda para os vizinhos e todos juntos ficavam conversando até bem tarde .
De madrugada, o leiteiro passava entregando o leite e um pouco mais tarde o padeiro deixava o pão quentinho. Mas, só após o apito da fábrica é que todos se levantavam. Os homens saíam para trabalhar e as mães preparavam seus filhos para a escola; durante o percurso eram muitos “bom-dia“. Algumas mulheres colocavam-se à janela para um papinho ou para fofocar, outras varriam suas calçadas e outras passavam apressadamente com um saco de roupas na cabeça. Tudo muito estranho realmente! À tarde, geralmente, as mulheres e suas empregadas faziam deliciosos quitutes: bolachinhas, bolos, biscoitos e a vizinha sempre ganhava uma generosa porção. Alguns dias depois, era a vizinha que vinha com outras guloseimas no prato emprestado, pois era ” falta de educação” devolvê-lo vazio.
Quando o casal saía a pé para passear, o homem tinha por costume zelar pela proteção da mulher tomando sempre a posição de ficar do lado da rua e a mulher “guardada” do movimento dos carros ou dos transeuntes.
Não era necessário dinheiro, cheque ou cartão de crédito na compra de alguma coisa, O costume era marcar, pôr na “conta”, ou na caderneta e no final do mês pagava-se o que estava devendo, sem juros, imaginem! Nas padarias era costume o proprietário agradecer o pagamento efetuado pelo cliente com alguns doces deliciosos.
Porém, nem tudo era um mar de flores nesse país muito estranho. As preocupações existiam, pois as ameaças sempre estiveram presentes na vida dos seres humanos, mas eles contavam com mecanismos de proteção infalíveis. Antes de dormir, as crianças olhavam embaixo da cama para verificar se não havia ladrão, e ao deitar pediam a bênção do pai e da mãe, após rezarem pedindo a proteção do anjo da guarda.
Os adultos quando saíam de casa, escondiam a chave no vaso do terraço, ou na janela, para que seus filhos pudessem entrar quando chegassem.
Os medos geralmente eram de assombrações, mulas- sem- cabeça, almas penadas.
Aventura era pular do trampolim na piscina, subir em árvore, escorregar no corrimão das escadas ou jogar amarelinha para chegar ao céu. É claro que nesse tempo as crianças não eram ”santinhas”, já faziam suas artes, como esconderem-se atrás da porta para observar a avó tirar a dentadura ou usar estilingue para matar passarinhos. Os adolescentes eram terríveis, escondiam-se no banheiro para fumar, as mocinhas, nos quartos, para lerem fotonovelas e no “escurinho do cinema” davam beijos apaixonados.
Consideravam “maior barato” mascar chiclete e bala Chita.
Tinham também suas crendices, como deixar o gomo menorzinho da tangerina secando para que Nossa Senhora viesse buscá-lo e dar um susto na pessoa que estava com soluço. Cantavam seu grito de guerra ao som da Jovem Guarda, “quero que vá tudo para o inferno”, “eu sou terrível”; tocavam com seus violões as músicas dos novos baianos que incitavam todos a saírem “sem lenço e sem documento”, e recebiam muitas outras influências , até do além mar - como um grupo de jovens cabeludos que faziam as meninas desmaiarem quando apareciam com suas guitarras cantando Yellow Submarine.
Realmente estranhos esses habitantes, pois não ficavam como nós assistindo ao Big Brother Brasil e pensando qual participante deve sair da casa e quem merece ganhar o prêmio e pousar nu para as revistas para finalmente conseguir a “fama”. Estavam sempre “gamados”, ou melhor, apaixonados, só queriam dançar de rostinho colado e de olhos fechados.
Estar na moda era ter uma calça jeans desbotada, (para isso, a esfregavam no tanque até ficar bem surrada).
Poderia continuar a relatar muitas outras esquisitices desse povo, mas vou terminar com o que considero o mais estranho e o mais “repugnante“ de todos os fatos.
O tempo, nesse tempo, era diferente, andava mais devagar. Uma mulher que não tivesse um namorado até por volta dos 20 anos ia ficar “pra titia” e, após os cinquenta anos, as pessoas eram consideradas velhas!
Ainda bem que a civilização moderna chegou!
autoria: Eliete T. Cascaldi Sobreiro

3 comentários:

  1. Lindo texto e tantas coisas boas daquele tempo, ao olhar da modernidade parecem surreais, mas era melhor,mais paz e tranquilidade, muito mais!!beijos,chica

    ResponderExcluir
  2. Ah que saudades! nós éramos mais felizes, o mundo era mais lindo... Gi

    ResponderExcluir
  3. Lindo texto, lindo tempo que voltará novamente? tomara,Ana

    ResponderExcluir

Apontadora de Idéias

Minha foto
São Paulo, Brazil
"A senhora me desculpe, mas no momento não tenho muita certeza. Quer dizer, eu sei quem eu era quando acordei hoje de manhã, mas já mudei uma porção de vezes desde que isso aconteceu. (...) Receio que não possa me explicar, Dona Lagarta, porque é justamente aí que está o problema. Posso explicar uma porção de coisas... Mas não posso explicar a mim mesma." (Lewis Carroll)

Arquivo do blog